Nos últimos dias, grande parte da imprensa alagoana tem difundido uma versão equivocada dos fatos ao afirmar que o deputado federal Paulão (PT) teria sido cassado. Não foi. A decisão do Tribunal Regional Eleitoral (TRE) não alcançou seu mandato, não determinou a perda de seu cargo e tampouco produziu efeito imediato sobre sua atuação na Câmara Federal. O que ocorreu foi a cassação do diploma de outro envolvido no processo e a determinação de retotalização de votos, procedimento que não implica, por si, cassação de mandato e que ainda pode ser revisto pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Apresentar esse episódio como “cassação de Paulão” extrapola o campo da interpretação e entra no terreno da imprecisão dos fatos, algo que fere um princípio básico do jornalismo, a distinção entre a disputa política e a verdade processual. Repor os fatos não é tomar partido, é resguardar o que deve ser inegociável, a própria verdade. É preciso encarar a desinformação com a mesma clareza exigida nos debates políticos.
Discordar faz parte da política. E eu já divergi, em muitos momentos, do deputado Paulão. Divergências, no entanto, não suspendem o compromisso com a verdade quando ela é evidente. E Paulão é, hoje, o melhor e mais importante deputado federal da bancada de Alagoas.
Sua trajetória não começa nos gabinetes, começa no chão da vida real. Eletrotécnico, iniciou sua vida profissional na antiga Companhia Energética de Alagoas (CEAL), de onde se aposentou. Foi no mundo do trabalho que construiu sua primeira escola política, o movimento sindical.
Ainda nos anos 80, liderou a Associação dos Técnicos Industriais de Alagoas. Em seguida, presidiu o Sindicato dos Urbanitários de Maceió, período em que se consolidou como liderança. Seu campo de atuação logo ultrapassou as fronteiras corporativas, conduzindo-o à direção da Central Única dos Trabalhadores (CUT) no estado, momento que o projetou como voz ativa das lutas sociais.
A política institucional surgiu como sequência natural de sua trajetória. Em 1996, foi eleito vereador por Maceió. Dois anos depois, chegou à Assembleia Legislativa, onde seria reconduzido por mais duas legislaturas, acumulando pouco mais de uma década de atuação como deputado estadual.
Em 2010, disputou uma vaga na Câmara Federal. Não se elegeu naquele primeiro momento, mas assumiu o mandato em 2013, na condição de suplente. A partir dali, veio a consolidação eleitoral, sendo reconduzido ao cargo em 2014, 2018 e 2022. Desde então, firmou-se como um dos mandatos mais consistentes do campo progressista em Alagoas, com atuação destacada na defesa da democracia, da educação pública, das universidades, dos institutos federais, dos direitos humanos, das pautas antirracistas e do fortalecimento das políticas sociais.
Fazer justiça factual, contudo, não nos exime da crítica política. Tenho duas inquietações legítimas em relação ao atual ciclo do deputado.
A primeira inquietação diz respeito ao Instituto Federal de Alagoas (Ifal). Paulão tem dialogado, apoiado pautas relevantes e destinado volume expressivo de emendas, o que é reconhecível e politicamente significativo. No entanto, esse compromisso precisa ir além do grupo político da gestão vigente no Ifal, que já ultrapassa 17 anos de hegemonia, período marcado mais por desgaste institucional do que por avanços democráticos, acadêmicos ou administrativos. Defender o Ifal não pode significar chancelar permanências que, ao longo do tempo, transformaram gestão em domínio, projeto institucional em projeto de um mesmo grupo político e agenda pública em lógica de manutenção de poder. O Ifal é maior do que qualquer gestão à frente da reitoria e pró-reitorias, maior do que seus dirigentes de campi e maior do que suas disputas internas. O compromisso com a instituição exige olhar para seu futuro estratégico, sua vocação social, sua missão educacional, sua diversidade e pluralidade, não para preservação de privilégios ou reprodução de estruturas que já não dialogam com as expectativas da comunidade acadêmica.
A segunda inquietação diz respeito à vinculação do deputado, por consequência, do próprio PT ao bloco de poder representado pelo MDB e, em especial, pelo senador Renan Calheiros. Alianças fazem parte da engrenagem política, mas há uma linha sensível entre dialogar com forças hegemônicas e ser absorvido por elas. Alagoas precisa de partidos políticos de esquerda que tenham autonomia real, independência programática e capacidade de enfrentamento, não de partidos condicionados aos ritmos, interesses e conveniências de um agrupamento familiar cuja tradição política se organiza menos pelo projeto e mais pela ocupação permanente do poder junto às oligarquias. Quando a autonomia se reduz, a força política se dilui.
Dito isto, Paulão foi eleito pelo voto direto, democrático e legítimo. Construiu seu mandato com identidade política própria, base social reconhecida e coerência pública. Seria profundamente injusto que perdesse o mandato por circunstâncias alheias à sua responsabilidade direta ou por equívocos processuais que envolvam outros atores políticos. Entre acertos, limites, tensões e divergências necessárias, o balanço é inequívoco, Paulão é o deputado federal mais consistente da atual bancada alagoana, o que não teme enfrentamentos e que, goste-se ou não de cada posição, está do lado das pautas públicas que interessam aos trabalhadores.
Daqui, este professor e jornalista independente reafirma sua solidariedade e seu respeito, na expectativa de que a justiça prevaleça e que qualquer julgamento ocorra onde deve ocorrer, nas urnas em 2026, longe de artifícios, atalhos ou tentativas de anular a vontade popular.










