“Tentei, ao assumir a Presidência da República, aliar a transição política a um pacto social, o de Moncloa. Fiz essa proposta. Infelizmente, as forças que me apoiavam não a aceitaram”. Palavras de José Sarney num artigo publicado na Folha em junho de 1998. Ao analisar a então conjuntura, no último ano do primeiro mandato de FHC, Sarney faz uma breve comparação com seu próprio governo, que foi uma usina de crises.
Moncloa é referência ao que se passou na Espanha, na transição democrática daquele país em fins da década de 1970. De fato, quando o governo Sarney colapsou, após a implosão do Plano Cruzado, todo analista político no Brasil defendia algo semelhante ao grande acordo espanhol. Todos empenhados numa ideia de unificação.
O acordo entre as forças rivais da política tinha um braço econômico, com projetos para diferentes setores produtivos. Simplificando brutalmente, era mais ou menos o modelo defendido por Sarney. Mas, como ele mesmo escreve, nada disso aconteceu.
Na década seguinte, já no governo Collor, essa história de acordo voltou ao debate. Para superar a crise monumental, vamos de união dos adversários, uma pactuação entre os grandes atores da economia e da política. Pelo país, as diferenças na geladeira.
Depois de quilômetros de entrevistas na TV e de textos nos jornais, de novo não rolou – e o governo Collor acabou como sabemos. Vez por outra, a tese reaparecia – como no artigo de Sarney no fim dos anos 90. E até hoje nunca botamos de pé nosso Pacto Social.
Eis que Michel Temer aparece à luz do dia, ou melhor, durante a noite da última segunda-feira, no Roda Viva. Convidado para analisar o panorama de agora, quando se fala de anistia para Bolsonaro e outros condenados por golpe de Estado, o que temos? O ex-presidente defende um grande “pacto nacional” para a “pacificação” do Brasil.
Temer usou a expressão várias vezes durante toda a entrevista. Bora juntar o Executivo, o Legislativo e o Judiciário nessa boa causa? Segundo ele, “essa polarização é algo terrível e precisa acabar”. Além da retórica teatral do proponente, temos algo pra valer?
Como o Brasil não é de brincadeira, ao lado de Michel Temer na gênese de um projeto para pacificar o país estão Aécio Neves e Paulinho da Força, dois deputados de notórias biografias. Sem pré-julgamentos, vamos aguardar por esse redivivo Pacto Nacional.