A implantação da Progressão Parcial nas escolas públicas estaduais tem gerado polêmica em Alagoas, especialmente no Colégio da Polícia Militar Tiradentes. A medida, determinada pela Portaria Seduc nº 15.022/2021, prevê que alunos possam avançar de série mesmo sem aprovação em todas as disciplinas — o que contraria a metodologia adotada pela instituição militar, pautada em disciplina e excelência acadêmica.

O Colégio Militar Tiradentes, vinculado à Polícia Militar de Alagoas, não aplicava o sistema de Progressão Parcial. Com a determinação da Secretaria de Estado da Educação (Seduc) para que todas as escolas da rede estadual adotem o modelo, pais, alunos e até parlamentares alagoanos se mobilizaram contra a medida.

A repercussão tomou conta das redes sociais, dos plenários da Assembleia Legislativa de Alagoas e da Câmara Municipal de Maceió, além de movimentar os bastidores do governo estadual. Diante da controvérsia, o deputado estadual Delegado Leonam (UNIÃO) convocou uma audiência pública para o dia 29 de agosto, com o objetivo de debater o tema com a comunidade escolar.

No entanto, um dia antes da audiência, o Colégio Militar publicou em suas redes sociais um comunicado informando que o impasse havia sido “resolvido e pacificado” junto à Seduc.

Card do aviso publicado em redes sociais. 

Mesmo assim, a Assembleia Legislativa de Alagoas realizou, na sexta-feira (29), a audiência pública para discutir a implantação da Progressão Parcial nas escolas da rede estadual. 

Audiência Pública sobre Progressão Parcial nas escolas militares de Alagoas, deputados estaduais: Cibele Moura, Delegado Leonam. Vereadores:  Jonatas Omena, Eduardo Canuto e Leonardo Dias. Foto: Ascom ALE. 

Estiveram presentes os deputados estaduais Delegado Leonam (UNIÃO) e Cibele Moura (MDB), além dos vereadores por Maceió Leonardo Dias (PL), Eduardo Canuto (PL) e Jônatas Omena (PL).

De acordo com a assessoria da Assembleia, o coordenador do Núcleo de Proteção Coletiva da Defensoria Pública, Othoniel Pinheiro, declarou que o órgão está analisando a situação sob o aspecto jurídico. Ele destacou a importância de alinhar a medida à Lei de Diretrizes e Bases da Educação, às resoluções do Conselho Estadual de Educação e aos regimentos internos das unidades escolares.

A audiência contou com ampla participação de pais e alunos, que demonstraram grande interesse e preocupação com o tema. A Secretaria de Educação não esteve presente, o que rendeu críticas do deputado Delegado Leonam durante a audiência: “faltar a um compromisso como esse é, no mínimo, falta de educação.", disse ele. 

O Portal CadaMinuto acompanhou os principais desdobramentos do caso e entrevistou o diretor da unidade Maceió, Tenente-Coronel Sidney Cunha, que falou sobre a metodologia e o compromisso da escola com a excelência educacional.

O que é Progressão Parcial e como ela afeta a avaliação dos alunos

A Progressão Parcial permite que estudantes avancem de série mesmo com reprovação em determinadas disciplinas. Segundo a Portaria Seduc nº 15.022/2021:

  • Alunos dos anos iniciais do Ensino Fundamental (1º ao 5º ano) podem progredir independentemente do número de disciplinas reprovadas.
  • Nos anos finais (6º ao 9º ano), é permitido avançar com reprovação em até 50% das matérias.
  • No Ensino Médio, o aluno pode ser promovido mesmo com reprovação em até metade das disciplinas, arredondando para o número inteiro subsequente, quando necessário.

Confira a Portaria na íntegra:

“Art. 6ª Terá acesso a oferta de Progressão Parcial, no âmbito da Rede Pública Esta-

dual de Ensino, os estudantes:

I - dos Anos Iniciais do Ensino Fundamental, reprovados independente do percen-

tual de carga horária da Matriz Curricular.

II - dos Anos Finais do Ensino Fundamental, reprovados em até 50% da carga

horária da Matriz Curricular;

III - do Ensino Médio, excepcionalmente, reprovados em até 50% do número de

componentes da Matriz Curricular, arredondando para o número inteiro subsequen-te, quando necessário.”

Essa metodologia é respaldada pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), de 1996, e vem sendo implementada gradualmente na rede estadual desde 2021.

Mobilização nas redes e petição pública

Alunos do Colégio Militar Tiradentes se manifestaram contra a Progressão Parcial por meio de vídeos nas redes sociais, alegando que a medida comprometeria a qualidade do ensino e os resultados da escola.

Veja um dos vídeos publicados:
Instagram - Vídeo dos alunos

Pais e responsáveis também organizaram uma petição pública direcionada ao Ministério Público de Alagoas, à Seduc e ao Comando da Polícia Militar. Até a data desta reportagem, o documento já contava com 5.361 assinaturas.

Trecho da petição:

“A Progressão Parcial, ao permitir que o aluno avance de série sem a plena aprovação em todas as disciplinas, comprovadamente diminui a qualidade do ensino e impacta negativamente o rendimento estudantil. Acreditamos firmemente que a aplicação desse regime no Colégio Tiradentes comprometeria os padrões de excelência que tanto prezamos.”

Página na internet da petição pública.

Você também pode acessar a petição completa clicando aqui. 

Repercussão política

A mobilização chegou à esfera política. O deputado estadual Cabo Bebeto (PL) criticou duramente a medida, classificando-a como “absurda”. Outros parlamentares, como Cibele Moura (MDB), Delegado Leonam (UNIÃO) e Ricardo Nezinho (MDB), também se posicionaram contra a Progressão Parcial.

Os deputados Gilvan Barros (MDB), Ricardo Nezinho (MDB) e Cabo Bebeto (PL) protocolaram um ofício junto ao Governo de Alagoas e à Seduc, alertando sobre os possíveis prejuízos pedagógicos da medida.

O vereador de Maceió, Leonardo Dias (PL), também se manifestou: “A melhor escola pública de Alagoas está sob ameaça.”

Em resposta à polêmica, a deputada estadual Cibele Moura apresentou, no dia 20 de agosto, o Projeto de Lei nº 1588/2025, que visa impedir a implantação automática da Progressão Parcial nas escolas públicas estaduais, incluindo as cívico-militares. Segundo o projeto, a adoção do sistema dependerá da aprovação do conselho de classe da unidade escolar.

Desempenho do Colégio Militar Tiradentes

O Colégio Militar Tiradentes se destaca em avaliações externas. No Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) de 2023, as unidades de Arapiraca e Maceió ficaram entre as três melhores escolas públicas do estado no Ensino Médio:

Ranking

Escola

Município

Nota

Monsenhor Luís Carlos de Oliveira BarbosaIbateguara6,6
Colégio Militar Tiradentes – Unidade AgresteArapiraca6,5
Colégio Militar Tiradentes – MaceióMaceió5,4

A média estadual é de 4,1, enquanto a nacional é de 4,3.  Ambas as escolas estão acima da média alagoana e acima da média nacional. 

No Enem 2024, segundo o ranking da empresa Evolucional, as unidades de Arapiraca e Maceió também figuraram entre as escolas com as maiores médias do estado.

Conforme a assessoria da Policia Militar de Alagoas, a unidade Maceió do Colégio Tiradentes, apresentou grande desempenho em olimpíadas de conhecimento. 

Segundo os resultados divulgados, 139 alunos alcançaram destaque, sendo 81 premiados em diversas Olimpíadas e 58 já aprovados para a segunda etapa da Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas (OBMEP).

Entre os 81 agraciados com premiação, estão alunos do 6º ano do Ensino Fundamental ao 3º ano do Ensino Médio, que conquistaram duas medalhas de ouro, 21 de prata e 23 bronze, além de 35 menções honrosas. 

As premiações ocorreram em reconhecimento ao desempenho nas olimpíadas Brasileira de Língua Inglesa (OBLI), Mandacaru e Brasileira de Astronomia (OBA).

Alunos recebendo premiação. Foto: Wendell Alves

OBMEP 2025

Ainda conforme a assessoria, a edição 2025 da OBMEP já conta com 58 alunos do colégio aprovados para a segunda fase, prevista para o próximo dia 25 de outubro. A primeira etapa ocorreu em 3 de junho, composta de prova objetiva com 20 questões, envolvendo estudantes de todo o Brasil.

Promovida pelo Instituto de Matemática Pura e Aplicada (IMPA), a OBMEP é a maior competição científica do país, reunindo anualmente mais de 18 milhões de alunos do 6º ano do Ensino Fundamental ao 3º ano do Ensino Médio, de escolas públicas e privadas brasileiras.

Entrevista com o diretor

O Portal CadaMinuto entrevistou o Tenente-Coronel Sidney Cunha, diretor da unidade Maceió do Colégio Militar Tiradentes, que falou sobre os pilares da instituição:

Tenente Coronel Sidney Cunha. Diretor do Colégio Tiradentes Macieó. Foto: Sargento Wendell Alves.

1. Quais as principais diferenças do Colégio Militar Tiradentes para outras escolas públicas de Alagoas?

O Colégio Tiradentes diferencia-se pela combinação entre ensino de qualidade, disciplina e formação cidadã. Além da grade curricular definida pela Secretaria de Educação, a escola adota métodos de gestão e acompanhamento que reforçam a responsabilidade, o compromisso com os estudos e o respeito às normas. Os alunos seguem um regimento com regras de vestimenta (uniforme) e comportamento, que promovem a igualdade e a unidade entre os estudantes. Isso garante índices de aproveitamento escolar acima da média da rede pública e contribui para a formação de jovens mais preparados para os desafios da vida acadêmica e profissional.

2. Como funciona a rotina diária dos alunos? Eles têm atividades voltadas aos estudos militares?

A rotina é estruturada para proporcionar disciplina e ordenamento. O aluno inicia o dia com momentos de formatura e organização, seguindo para as aulas regulares. Além do currículo tradicional, há atividades voltadas à prática de civismo, noções de hierarquia, ordem unida e respeito aos símbolos nacionais. Não se trata de uma formação militar profissional, mas de uma vivência escolar inspirada em valores militares, que estimula responsabilidade, espírito de equipe e autonomia pessoal.

3. Quais são os principais valores que a escola busca transmitir aos alunos?

Buscamos formar não apenas bons estudantes, mas cidadãos conscientes. Entre os valores mais enfatizados estão: disciplina, respeito, ética, patriotismo, responsabilidade social, espírito de equipe, comprometimento e honestidade. Esses princípios acompanham o aluno tanto dentro quanto fora da escola.

4. Como o senhor responde às críticas de que o modelo é muito rígido para os alunos?

A disciplina não deve ser entendida como excesso de rigidez, mas como ferramenta pedagógica. O modelo adotado pelo Colégio Tiradentes é pensado para criar um ambiente seguro, estável e propício ao aprendizado. Muitos pais e alunos reconhecem que a disciplina auxilia no desenvolvimento da autonomia, da autoconfiança e da capacidade de enfrentar desafios com resiliência.

5. Como é a participação dos pais ou mães em relação à gestão da escola?

A família é parte essencial do processo educativo. O colégio promove reuniões periódicas, canais de comunicação direta e atividades integradas que fortalecem o vínculo escola-família. A gestão escolar valoriza a participação dos pais e responsáveis, entendendo que o sucesso do aluno depende dessa parceria contínua. Inclusive no Conselho Escolar do Colégio Tiradentes existe uma representação de pais de alunos, onde participam de decisões importantes do colégio.

6. Existe uma formação específica dos professores para atuarem nesse modelo? Todos os professores são militares?

Não. Os professores responsáveis pelas disciplinas curriculares são na sua grande maioria civis, formados em suas áreas específicas de atuação, assim como nas demais escolas públicas. Temos apenas cinco militares como professores das disciplinas tradicionais. O diferencial é que eles atuam em conjunto com militares que exercem funções administrativas, de apoio e de orientação disciplinar. Há também formações internas e treinamentos periódicos para alinhar todos os profissionais ao modelo de ensino adotado.

 

Procurada pelo CadaMinuto, até a publicação desta reportagem, a Secretaria de Estado de Educação de Alagoas não se posicionou sobre o assunto. O espaço segue aberto para manifestação.  

 

CAPA: Alunos em formação. Foto: Sargento Wendell Alves. 

 

 

 

 

*Estagiário sob supervisão da editoria.