Nos últimos dias, Maceió presenciou uma das maiores mobilizações camponesas do estado nos últimos anos. A chamada Semana Camponesa começou no domingo, 20 de julho, com a chegada de mais de mil trabalhadores e trabalhadoras rurais à capital. Liderados por oito organizações do campo, entre elas o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), a Frente Nacional de Luta (FNL), a Comissão Pastoral da Terra (CPT), o Movimento Terra Livre, o Movimento Social de Luta (MSL), o Movimento Popular de Luta (MPL), o Movimento Via do Trabalho (MVT) e o Movimento Terra, Trabalho e Liberdade (MTL), os movimentos ocuparam o pátio da Secretaria de Agricultura do Estado de Alagoas, no centro da cidade. Desde então, passaram a cobrar do governo estadual avanços concretos na política de Reforma Agrária.
Na terça-feira, dia 22, os movimentos marcharam até o prédio do Incra em Alagoas, onde acamparam e permaneceram mobilizados como parte da Jornada Nacional de Lutas pela Terra, que ocorre simultaneamente em vários estados do Brasil. Em Alagoas, a pauta apresentada ao governador Paulo Dantas (MDB) incluiu, entre outras reivindicações, a retomada das terras das usinas falidas Laginha e Guaxuma e a criação de políticas públicas para o fortalecimento dos assentamentos já existentes.
Em nota pública, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) reafirmou que o acampamento é parte das ações da Semana Camponesa e que visa dar visibilidade à urgência da Reforma Agrária no estado. O movimento também reivindica a criação de políticas agrícolas para fortalecer os acampamentos e assentamentos em Alagoas, reforçando que a luta é legítima, democrática e histórica.
Enquanto trabalhadores do campo ocupavam pacificamente os espaços públicos para cobrar seus direitos, a extrema-direita local reagia com o mesmo script de sempre: criminalização, distorção e retórica intolerante. Deputados, vereadores e influenciadores bolsonaristas aproveitaram a oportunidade para alimentar suas redes com ataques preconceituosos e falas recheadas de desinformação.
O deputado federal Delegado Fábio Costa (PP) afirmou que os manifestantes são “massa de manobra” dos “desgovernos” de Lula (PT) e Paulo Dantas, e que a ocupação atrapalha o comércio e prejudica a população. Cabo Bebeto (PL), deputado estadual, classificou a manifestação como crime, acionando a Seagri com base em lei de sua própria autoria para responsabilizar os sem-terra. O vereador Thiago Prado (PP) foi além, acusando os movimentos de causar “desordem e baderna” e defendeu projeto de lei que prevê a remoção de barracos e acampamentos em praças e logradouros públicos. O vereador Leonardo Dias (PL) e o deputado estadual Delegado Leonam (UNIÃO) seguiram na mesma linha, alegando prejuízo ao comércio e prometendo tomar providências cabíveis.
Grande parte dos veículos de comunicação repercutiu e amplificou esse discurso, tratando como notícia o posicionamento conservador e reacionário desses parlamentares. Em vez de contextualizar a luta dos movimentos sociais, optaram por reforçar a criminalização, reproduzindo vídeos e falas que desinformam, distorcem e atacam o direito legítimo à mobilização popular.
Curiosamente, nenhum desses parlamentares se mostrou incomodado quando, logo após a derrota eleitoral de Jair Bolsonaro (PL) em 2022, apoiadores do ex-presidente permaneceram acampados por semanas em frente ao quartel do Exército na Avenida Fernandes Lima. Com bloqueios, discursos golpistas, ameaças à democracia e incitação ao caos, causaram transtornos reais e não simbólicos. Nenhuma nota de repúdio, nenhuma fala exaltada, nenhum projeto de lei emergencial foi apresentado por esses mesmos políticos.
Fica evidente que a reação não se trata de preocupação com a ordem ou o bem-estar da população, mas sim de intolerância com o povo pobre, trabalhador e organizado. Quando a mobilização vem de cima, do agronegócio, dos empresários ou dos militares, ela é vista como legítima. Quando vem de baixo, dos campos e das periferias, vira crime, bagunça, invasão.
A resposta dos setores da esquerda precisa ter a mesma força, resistência e engajamento. Defender os movimentos sociais é defender a democracia. É reconhecer que ocupar uma praça ou um prédio público em protesto pode até gerar desconforto, mas esse desconforto é parte essencial da convivência democrática. Democracia não é silêncio. É disputa, enfrentamento, tensionamento.
O medo da extrema-direita alagoana é claro. Medo de que o povo pobre deixe de ser espectador e se torne protagonista. Medo de que a organização coletiva ganhe corpo, espaço e voz. Medo de que as ruas voltem a ser o palco da luta social.
Eles não temem a desordem. Eles temem o povo.