A publicação do Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas (PCDT), que regulamenta o direito ao acesso a medicamentos à base de canabidiol pelo SUS de Alagoas, em 1º de julho de 2025, é resultado de uma decisão favorável do Tribunal de Justiça de Alagoas (TJ-AL), a uma ação civil ajuizada pela Defensoria Pública Estadual.
Em entrevista ao CadaMinuto, o defensor público Daniel Alcoforado contou que a Ação Civil Pública para obrigar o Estado a regulamentar a Lei Estadual 8.754/2022 (de autoria do então deputado Lobão), publicando o protocolo clínico, foi ajuizada pela Defensoria em março deste ano.
O defensor alerta, no entanto, que o protocolo ainda é tímido e gerou certa frustração de pacientes e familiares com relação a não inclusão de diversas outras doenças que podem ser também tratadas com a cannabis medicinal. Ele explica que, conforme o protocolo, a medicação será fornecida apenas a pacientes com epilepsia refratária e prescrição especializada.
“Um próximo passo da Defensoria é lutar pela ampliação do alcance do protocolo, com a inclusão de novos CIDs e condições clínicas que também possuem respaldo científico para o uso do canabidiol, já que a epilepsia refratária, embora importante, não esgota a diversidade de quadros que podem se beneficiar da medicação, a exemplo do TEA, TDAH, transtornos de ansiedade, distúrbios do sono e dores crônicas. Essas são algumas condições clínicas, dentre outras, que também contam com respaldo científico para uso de canabidiol, mas ainda não estão incluídas no protocolo da Sesau”, detalhou Daniel.
Fornecimento imediato
Segundo o defensor, com a publicação do protocolo, o Estado passa a ter obrigação legal, administrativa e judicial de fornecer, de forma imediata, o medicamento a todos os pacientes que se enquadrem nos critérios técnicos, como crianças e adolescentes com epilepsia refratária e prescrição especializada.
“Neste caso, a obrigação está reforçada por uma decisão do TJ/AL, que determinou expressamente a edição do protocolo e o início do fornecimento, com base na ação civil pública movida pela Defensoria. A partir daí, não cabe mais omissão. O Estado tem que garantir a aquisição dos medicamentos imediatamente, inclusive, se necessário, por meio de processos emergenciais de compra pública, como já ocorre com outros medicamentos de uso essencial”, explicou.
Reforçando que “o direito está regulamentado, a decisão judicial está em vigor, e o fornecimento tem que começar de forma efetiva, com planejamento, estoque e dispensação no SUS”, Daniel relata que, conforme informações repassadas pela Secretaria de Estado da Saúde (Sesau), hoje 101 pacientes pediátricos com diagnóstico de epilepsia refratária têm acesso aos medicamentos, muitos deles em razão de decisões judiciais individuais.
Com o novo protocolo, publicado em 1º de julho, a própria Sesau estima um aumento de cerca de 50 % no número de paciente atendidos, o que daria algo em torno de 150 crianças e adolescentes beneficiados inicialmente. “Essa estimativa poderá ser melhor dimensionada a partir da implantação efetiva do protocolo, com monitoramento ativo dos casos atendidos”, acrescentou.

Acompanhamento e Histórico
Ainda conforme o defensor, além de lutar pela ampliação do alcance do protocolo, a Defensoria Pública seguirá acompanhando o fornecimento dos medicamentos, por meio do monitoramento regular dos atendimentos e evolução da cobertura pela Sesau; da atuação em casos individuais de negativa ou atraso injustificado; e participação em espaços de controle social e nos debates técnicos sobre ampliação da política.
A mobilização para regulamentação da lei começou em fevereiro deste ano, com reunião entre a Defensoria e familiares de crianças e adolescentes com prescrição médica para uso de canabidiol. No mesmo dia, foi expedido ofício à Secretaria de Estado da Saúde (Sesau), requisitando informações sobre o cronograma de implantação da lei; existência de protocolo clínico; critérios de acesso ao medicamento; e número de beneficiários.
Em 10 de março, a Sesau respondeu informando sobre a criação de um grupo de trabalho, “sem apresentar medidas concretas”, portanto, “diante da omissão, a Defensoria ingressou com a Ação Civil Pública nº 0700317-73.2025.8.02.0090, em 13 de março, solicitando tutela de urgência para forçar a regulamentação”.
Após indeferimento de liminar pela 28ª Vara da Infância e Juventude, a Defensoria interpôs agravo ao TJ-AL, que em 22 de abril, deferiu a liminar determinando ao Estado a publicação do PCDT no prazo de 30 dias.
“A cronologia dos atos demonstra que a regulamentação do uso de canabidiol no SUS alagoano só ocorreu por força da ação coletiva da Defensoria Pública e da decisão do TJ-AL. Não há registro de iniciativa concreta do Estado antes da judicialização”, concluiu Daniel Alcoforado.
A reportagem procurou a Sesau que, até o fechamento da matéria, não se pronunciou.