Desde sua primeira candidatura em 1989 até sua consagradora recente vitória em 2022, Lula (PT) construiu uma trajetória política marcada por um vínculo visceral com o povo nordestino. Ele é, por excelência, o maior símbolo de identidade, força e representação popular do Nordeste no cenário nacional. Nunca precisou de um vice da região para afirmar essa conexão. Ele é o próprio Nordeste no poder.
Mais do que uma estratégia de afirmação pessoal, essa configuração eleitoral parte de uma constatação concreta: é assim que o povo nordestino enxerga Lula. Ele não é percebido como alguém que representa o Nordeste, mas como alguém que é o Nordeste. Essa relação não depende de intermediários ou figuras complementares na chapa. O eleitorado da região reconhece nele um dos seus e esse reconhecimento é o que o torna hegemônico nas urnas do Nordeste há mais de duas décadas.
Em todas as chapas presidenciais que disputou, Lula sempre buscou composições com nomes de fora do Nordeste, majoritariamente do Sul e Sudeste. Em 1989 teve como vice o gaúcho José Paulo Bisol. Em 1994, repetiu a aliança com Bisol. Em 1998, após a frustrada tentativa de aliança com Leonel Brizola, Lula acabou formando uma chapa puro sangue com Aloizio Mercadante, paulista e economista ligado ao PT. Em 2002 e 2006, a dobradinha com o empresário mineiro José Alencar representou uma aliança com setores conservadores da economia. Já em 2022, optou por Geraldo Alckmin, paulista, novamente ancorando o centro político e econômico do país na região Sudeste.
Essa escolha segue um padrão que revela a função real do vice-presidente numa chapa. Ele cumpre três dimensões fundamentais: estratégia eleitoral, governabilidade política e sucessão institucional. No campo eleitoral, o vice serve para agregar setores sociais, econômicos ou regionais que o titular não abarca diretamente. É uma peça de composição, não de afirmação redundante. Lula nunca precisou de um vice nordestino porque é ele mesmo quem assegura a sustentação eleitoral da região com soberania. Já no plano da governabilidade, o vice pode atuar como articulador, facilitando relações com o Congresso, empresariado ou segmentos políticos estratégicos. E, por fim, há a dimensão da sucessão institucional. O vice é o presidente em potencial, caso ocorra afastamento, renúncia ou impedimento do titular. Daí a importância de escolhas calculadas e com perfil de estabilidade.
Por isso soa risível, para não dizer caricato, a tentativa de se emplacar nomes como o de Renan Calheiros Filho (MDB) como possível vice de Lula em 2026. Essa tese não se sustenta politicamente, eleitoralmente e tampouco simbolicamente. É um devaneio que parece mais um movimento orquestrado por núcleos próximos ao ministro alagoano para superdimensionar seu papel como senador e ministro dos Transportes no governo.
Além de desnecessária, essa especulação beira o vexame. Lula não precisa de um vice nordestino. Ele é o maior cabo eleitoral da história da região. Forçar esse encaixe soa forçado, oportunista e artificial.