A eleição de Robert Francis Prevost como Papa Leão XIV não é apenas um fato inédito por sua origem estadunidense. É, sobretudo, um movimento político meticulosamente desenhado por Francisco. Um gesto de continuidade, mas também de recalibragem. Francisco não apenas preparou a Igreja para o futuro — ele desenhou esse futuro com mãos firmes e escolhas estratégicas.
Leão XIV pode ter nascido em Chicago, mas foi no Peru que se fez bispo, pastor e liderança. Foram quase quatro décadas de presença silenciosa e firme nas periferias de Chiclayo, onde consolidou não só sua identidade pastoral, mas também seu capital político e eclesial. E foi justamente esse currículo, forjado longe dos holofotes romanos, que lhe garantiu a confiança de Francisco.
Francisco pavimentou a ascensão de Prevost ao centro do poder vaticano. Nomeou-o prefeito do Dicastério para os Bispos, cargo-chave responsável por moldar o futuro da hierarquia católica. Ali, Prevost mostrou-se alinhado ao estilo bergogliano: menos pompa, mais escuta. Menos tribunal, mais presença pastoral. A sucessão, portanto, não foi obra do acaso, mas a expressão de uma transição cuidadosamente construída.
A escolha de Leão XIV representa o reforço de uma Igreja menos eurocêntrica, mais periférica e latino-americana em sua sensibilidade. É o símbolo de uma globalização eclesial que rompe com a lógica tradicional das cúpulas italianas e volta seu olhar para as margens. Não por acaso, a trajetória de Prevost no Peru carrega marcas que dialogam com os pilares de Francisco: opção pelos pobres, acolhimento dos migrantes, defesa da dignidade humana.
É um engano pensar que a Igreja Católica é alheia aos tabuleiros da geopolítica. A eleição de Leão XIV é um recado ao mundo: a liderança moral do catolicismo seguirá comprometida com os valores de escuta, inclusão e discernimento — sem abrir mão da firmeza doutrinária. Francisco fez sua parte. E deixou, como todo grande líder, não apenas um legado, mas um sucessor à altura da estratégia.
O conclave apenas confirmou o que já estava sendo gestado nos bastidores do Vaticano: Francisco não improvisou. Ele conduziu.