“A suruba do aplicativo” A economia liberal não proíbe trepar no local.

15/04/2021 22:00 - Trabalho do Carvalho
Por redação
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Felipe, um jovem adulto, pagou uma fortuna de diária para comemorar seu aniversário numa bela casa com piscina e ampla área de lazer, disponível em um conhecido aplicativo de aluguel de imóveis. Aliás, os economistas liberais do século XIX, quando pensaram na mão invisível do mercado, não imaginaram o que tais ferramentas digitais são capazes de fazer: para tudo há um preço, basta negociar utilizando alguns cliques.

A proprietária da casa, a Dona Verônica, liberal na economia e conservadora nos costumes, descobriu pelas redes sociais que Felipe fez uma festa que não se resumiu ao bolo e às velinhas, promovendo uma suruba bem animada, cujas fotos e vídeos viralizaram em apenas algumas horas de hoje, bombando na internet.

Dentre todo o material divulgado, destacam-se os áudios da conversa da proprietária e do locatário sobre a clareza dos termos da negociação e se este último teria infringido, de alguma forma, a política do aplicativo.

Em verdade, ao render-se aos encantos do mercado, a proprietária renunciou ao poder de definir muitas das regras de conduta no seu imóvel. Felipe poderia ter tirado a camisa na hora do almoço, deixado a tampa do vaso sanitário aberta, mas preferiu fazer uma orgia comemorativa em seu aniversário, diga-se de passagem, uma atividade lícita se amplamente consentida pelos participantes maiores de idade.

Dona Verônica alugou seu imóvel e se sentiu vilipendiada pela ampla desregulamentação do mercado. Imaginem os milhares de trabalhadores que não possuem nada mais que o próprio corpo e alugam, todos os dias, a sua força de trabalho em aplicativos que não pagam direitos trabalhistas, exploram o trabalho ao máximo, remuneram com valores irrisórios e expõem os trabalhadores a toda sorte de riscos.

Para esses trabalhadores resta muito pouco: resta apenas participar dessa ampla suruba de exploração promovida pela mão nada boba e invisível dos aplicativos e cujas práticas nocivas ao direto laboral geram pouca ou nenhuma comoção da sociedade. 

Para escutar a conversa entre Dona Verônica e Felipe, clique aqui:

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