“Venom, Homem-Aranha, Bolsonaro e Lula” As eleições como enredo de quadrinhos.

04/10/2018 14:00 - Trabalho do Carvalho
Por Trabalho do Carvalho
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Explicar para a tia aposentada que o décimo terceiro salário não é uma “bolsa para vagabundo”, bem como não “atravanca o desenvolvimento nacional”, me deixou, no mínimo, frustrado. O décimo terceiro é justo porque os salários no Brasil são pagos “por mês” e não “por semana”. Basta pegar o calendário e contar os dias do ano.

Sofrer para explicar uma coisa tão cristalina para alguém que passou toda uma vida laboral recebendo aquele direito, mas passou a achar um “absurdo” por causa do que ouviu nessas eleições, me deixou perplexo e sem forças.

Então resolvi dar um descanso e ir ao cinema. Pensei em assistir um filme de super-heróis, algo despretensioso, supostamente sem grandes conteúdos significativos. Nada muito além do mocinho que sempre ganha do vilão no final da história. Seria uma boa desculpa para me alienar da discórdia de uma eleição que transforma almoços de família e redes sociais em um inferno.

Fui ver o tal do “Venom” que, até então, pelo menos para mim, era um vilão e arqui-inimigo do Homem-Aranha, meu super-herói preferido.

Se você não conhece o Venom, faço questão de apresentar: Eddie Brock, um jornalista comum, foi infectado por uma gosma negra alienígena, uma raça de simbiontes, que oferece ao hospedeiro poderes como força sobre-humana, velocidade, capacidade de cura, resistência e outras vantagens inimagináveis.  

Mas o preço que Eddie paga é alto: o monstro superpoderoso, resultado da junção de Eddie com o simbionte, é desprovido de senso ético, apreço pela lei e pela humanidade.

Eddie: Nós não podemos machucar as pessoas.

Venom: Olhe nos meus olhos, Eddie. Nós podemos fazer o que quisermos...

Foi justamente aí que a ficha caiu: o Venom não é um vilão, mas um “anti-herói”.

O que deveria ser uma experiência banal adquiriu a densidade de uma gosma negra alienígena com repercussões eleitorais. O “anti-herói” é alguém que combate algo supostamente pior do que ele, utilizando-se de todos os meios possíveis, ainda que descomprometidos com a ética, com o respeito à vida humana, com a propriedade privada e com a lógica racional econômica. Em resumo, ele é um Maquiavel dos quadrinhos para quem todos os fins justificam os meios.

Passamos a valorizar os “anti-heróis” porque os “antigos” heróis foram desconstruídos e não mais representam a honra, o altruísmo e a bondade. De uns tempos para cá, nos filmes, os heróis, mesmo os clássicos, passaram a ser mostrados como indivíduos cheios de erros e por isso pouco confiáveis.

Mutatis mutandis, foi justamente isso que aconteceu com a política em nosso País. Hoje a palavra “política” virou sinônimo de imoralidade e corrupção generalizada. Políticos foram jogados na latrina, todos rotulados como ladrões. Passaram a ser os vilões de nossa realidade.

Para combatê-los surgiram os “antipolíticos”, autodeclarados “foras desse meio”, mas que são “foras da lei”, sujeitos a dispor de todos os meios possíveis para conseguir os seus fins, ainda que pela restrição de nossas liberdades e direitos, tortura, autoritarismo, misoginia, preconceito e com a bílis da intolerância ao próximo.

Fomos contaminados pela mesma gosma negra e alienígena que transformou Eddie no Venom: um monstro assustador, livre para destruir, arrebentar e matar quem atravessa seu caminho na hora errada.

Não adianta dizer que “eles”, os políticos, não prestam, que “eles” não nos representam, que “eles” são ladrões e que “eles” são a fonte de todos os problemas do País. Na verdade, “eles” são apenas o reflexo da sociedade doentia que nos tornamos. Passamos a ser antiéticos, desprovidos de consideração e respeito ao direito do próximo.

Nós somos Venom!

Olha ele aqui:

 

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