A quem interessa Lula fora do jogo eleitoral em 2018? A muita gente, mas com certeza absoluta a amplos setores da própria esquerda. O aparente paradoxo é somente isto, aparência e nada mais. E não é assim apenas a partir dos fatos recentes, com a condenação em segunda instância, habeas corpus rejeitado pelo STF e prisão decretada pelo juiz paladino Sergio Moro. A coisa vem lá de longe.

 

Quando falo na esquerda que comemora, em silêncio, a tacada mortal no velho Lula, incluo medalhões (e medalhinhas) do próprio barco do PT. É entendimento comum que o gigantismo político do ex-presidente, ao longo das décadas, barrou a ascensão de novas lideranças capazes de atrair a atenção e os votos do eleitor. Em todo esse tempo, ou era com ele... Ou era com ele também.

 

De caso pensado ou involuntariamente, Lula sabotou alternativas em sua própria casa. De Eduardo Suplicy a José Dirceu; de Olívio Dutra a Tarso Genro; de Luiza Erundina a Chico Alencar; de Marta Suplicy a Patrus Ananias – ninguém chegou nem perto do protagonismo exercido pela estrela maior da legenda. Cito esses nomes de memória, mas na lista cabe muito mais gente.

 

A multidão de companheiros que jamais conseguiu se impor ao menos para dividir com Lula a força petista explica Dilma Rousseff. Contrariando todo mundo ao seu redor, até os “históricos” do partido, ele inventou, na eleição de 2010, uma candidata sem qualquer ligação maior com o petismo. Dilma sempre militou no PDT. Trocara de legenda havia pouco tempo e, mesmo assim, foi imposta.

 

Essa realidade incomoda os filiados desde sempre, mas nenhuma voz desafiou o comando onipresente de Lula. Nos últimos anos o quadro no PT apenas se agravou. Prova definitiva é o cenário desolador de agora, em que a legenda vive seu momento mais dramático. Sem Lula nas urnas, Fernando Haddad e Jaques Wagner soam como possibilidades remotas, prontos para a derrota.

 

Para além do PT, demais siglas de esquerda não confessam, mas Lula banido da eleição marcada para daqui a seis meses não deixa de ser oportunidade ao crescimento de algum nome dessas forças. Não há dúvidas de que Rede, PSOL, PC do B, PSB e PDT lamentam o calvário lulista – mas isso não passa de discurso. Em particular, veem no drama uma porta que se abre.

 

Em termos de pré-candidatos, ninguém mais que Ciro Gomes, o coronelzinho do Ceará, está mais afoito com o cenário pós-Lula. Não por acaso, finge descaradamente que está arrasado com o “amigo” a caminho da prisão. Nada mais falso. A cada palestra que proferiu nos últimos quatro anos, Ciro cansou de chamar Lula de ladrão. Em suas piruetas, não poupou nem a família do ex-presidente.

 

Mas agora ele aparece se derramando em lágrimas pela iminente prisão do petista. Claro! O sonho dourado de Ciro é ser candidato em aliança com o PT, que assim deixaria de apresentar um nome próprio, para apoiá-lo. Ele avalia que tem muito mais chance de herdar os votos de Lula, bem mais que qualquer outro petista. Com essa ideia na cabeça, é capaz de beijar os pés de Lula e do PT.

 

Ao falar sobre a prisão do ex-presidente, Ciro disse estar “muito triste”, e cobrou cadeia também para os “corruptos do PSDB e da direita”. Repito: é um descarado se oferecendo como candidato ao PT. Vai repetir esse discurso todo santo dia, na esperança de convencer Lula a indicá-lo para a eleição. A propósito, esse guerrilheiro revolucionário nasceu no berço do PDS, nada menos que a velha Arena, o partido oficial dos brucutus da ditadura. Como se vê, Ciro é tudo, até progressista na veia.