O Decreto Emergencial e a contratação prevista no art. 24, inciso IV, da Lei das Licitações (Lei nº 8.666/93)

14/11/2016 16:35 - Cláudia Pereira
Por redação

                 Após a posse dos novos gestores municipais, cujo primeiro mandato se inicia em 1º de janeiro de 2017, um dos primeiros problemas a ser enfrentado é encontrar a Prefeitura com estoques de medicamentos, gêneros alimentícios, materiais de limpeza e consumo zerados, com contratos vencíveis em 31 de dezembro deste ano e improrrogáveis. Encontrar uma fórmula legal de manter em funcionamento os serviços essenciais do Município até a conclusão de novos processos licitatórios visando à aquisição de bens e serviços tem sido bastante discutido nos Tribunais.  O gestor poderia confiar na possível existência de um Decreto Municipal, declarando situação de emergência no Município, e contratar todos os bens e serviços com base no art. 24, inciso IV, da Lei nº 8.6666/93?

 

            Nesse sentido, reza o art. 24, IV, da Lei das Licitações, in verbis:

“Art. 24.  É dispensável a licitação:

[...];

IV - nos casos de emergência ou de calamidade pública, quando caracterizada urgência de atendimento de situação que possa ocasionar prejuízo ou comprometer a segurança de pessoas, obras, serviços, equipamentos e outros bens, públicos ou particulares, e somente para os bens necessários ao atendimento da situação emergencial ou calamitosa e para as parcelas de obras e serviços que possam ser concluídas no prazo máximo de 180 (cento e oitenta) dias consecutivos e ininterruptos, contados da ocorrência da emergência ou calamidade, vedada a prorrogação dos respectivos contratos;”

 

                        A princípio, não parece suficiente a existência do aludido Decreto para o Gestor abrir processos emergenciais a torto e a direito. Aliás, essa prática vem sendo utilizada há décadas, e vários gestores foram penalizados pela inobservância de exigências legais que circundam as contratações emergenciais. O Tribunal de Contas da União - TCU se pronunciou recentemente acerca disto, senão vejamos:

Auditoria realizada na Prefeitura Municipal de Araripina/PE, em virtude de possíveis irregularidades na aplicação de recursos públicos federais noticiadas ao TCU pelo procurador-geral do Ministério Público de Contas do Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco, tratou, entre outras ocorrências, da contratação emergencial de empresas por dispensa de licitação para prestação de serviços de transporte escolar, fundamentada no art. 24, inciso IV, da Lei 8.666/1993, que adotara como motivação expressa o Decreto Municipal 352/2009 (declarara situação de emergência municipal). Incialmente, destacou o relator que, conforme verificado na etapa processual anterior, “as motivações que ensejaram a prolação do decreto não se enquadram na caracterização de emergência para fins de dispensa de licitação descrita no art. 26 da Lei de Licitações”. Ao analisar o mérito, após audiência dos responsáveis, dissentiu o relator da proposta da unidade técnica especificamente quanto ao entendimento de que a emissão de pareceres jurídicos favoráveis à contratação por dispensa de licitação não constituiria erro grosseiro. Destacou que “a mera existência de decreto municipal caracterizando a situação do município como emergencial não é suficiente para enquadrar as contratações nos requisitos da Lei 8.666/1993 para dispensa de licitação. Era de se esperar que os pareceristas verificassem, no caso concreto, se os fatos que permeavam as dispensas de licitação se amoldavam, realmente, a alguma das hipóteses de dispensa da Lei de Licitações, o que não ocorreu”. Nesse sentido, explicou o relator que “o Decreto 352/2009, utilizado como fundamento para as dispensas de licitação, possuía como causa a estiagem prolongada na região e a suposta desordem em que se encontrava o município quando a nova gestão assumiu a sua dianteira. Nos termos do decreto, os prejuízos aos serviços de educação consistiam na precariedade de parte do mobiliário das escolas e na destruição total da frota de apoio às ações educacionais”. Entretanto, prosseguiu, a equipe de auditoria constatara que, “nos anos anteriores, a prestação de serviço de transporte escolar dava-se por meio de motoristas autônomos contratados e, portanto, independia da frota do município”. Acrescentou o relator que o parecer favorável a uma das contratações era ainda mais falho, considerando-se que já havia sido realizada contratação por dispensa para o mesmo fim, e que, durante o período de execução do contrato anterior, “não foram adotadas providências para a regularização da situação do transporte escolar no município de forma mais definitiva”. Por essas razões, acolhendo proposta do relator, o Plenário decidiu aplicar também aos pareceristas a multa prevista no art. 58, inciso II, da Lei 8.443/1992.

Acórdão 2504/2016 Plenário, Auditoria, Relator Ministro Bruno Dantas.

 

                        Como podemos perceber, a mera existência de Decreto Municipal que declare a situação de emergência não é suficiente para a dispensa prevista no art. 24, inciso IV, da Lei nº 8.666/93, pois a Administração Pública deverá verificar se os fatos que justificam a contratação extraordinária, embasada no referido diploma administrativo-legal, se amoldam, de fato e incontestavelmente, à hipótese de dispensa de licitação. Verificada a inobservância do marco legal nas contratações diretas, os responsáveis estão sujeitos à aplicação da multa prevista no art. 58, inciso II, da Lei nº 8.443/1992.

                       

Referências Bibliográficas

 

BRASIL. Lei Federal nº 8.666, de 21 de junho de 1993. 

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8666cons.htm

 http://portal.tcu.gov.br/jurisprudencia/boletins-e-informativos/informativo-de-     licitacoes-e-contratos.htm

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