GESTOR E FISCAL DO CONTRATO: atribuições e responsabilidades segundo o Tribunal de Contas da União

06/06/2016 15:33 - Cláudia Pereira
Por Cláudia Cristina de Melo Pereira

            A má execução contratual é um dos maiores problemas da esfera negocial na Administração Pública e tem gerado enorme prejuízo financeiro. A falta de controle na execução contratual, a ineficiência, o desperdício, os desvios e a corrupção são normalmente evidências de ausência de fiscalização no controle dos contratos administrativos. Tanto é assim que não foi à toa que o legislador brasileiro criou, por meio da Lei Geral de Licitações, a ilustre figura do Fiscal do Contrato, conforme disposto no art. 67  da Lei nº 8.666/1993:

Art.67. A execução do contrato deverá ser acompanhada e fiscalizada por um representante da Administração especialmente designado, permitida a contratação de terceiros para assisti-lo e subsidiá-lo de informações pertinentes a essa atribuição (grifo nosso).

 

                Como podemos perceber, o dispositivo supramencionado não faz alusão ao gestor do contrato. Todavia, é necessário diferenciarmos esses dois sujeitos tão comumente confundidos, eis que possuem atribuições semelhantes, não esquecendo que ambos, gestor e fiscal do contrato, devem atuar em perfeita sintonia, pois objetivam, cada um a seu tempo e modo, a perfeita execução do contrato.

 

                        O gestor do contrato é o responsável por tomar as medidas necessárias ao fiel cumprimento da avença administrativa, pois lhe incumbem as estratégias de gestão, tais como as questões relacionadas ao equilíbrio econômico-financeiro do contrato, pagamentos etc. Já a figura do fiscal do contrato fica encarregada da parte operacional do acordo administrativo, ou seja, do acompanhamento cotidiano da execução do contrato, cabendo-lhe verificar o cumprimento dos prazos e de outras condições estabelecidas pelas obrigações assumidas entre contratante e contratado, para que a Administração se certifique que está sendo executado o que efetivamente fora pactuado.

 

                         Mister frisar que a Administração tem o dever de propiciar condições necessárias para uma fiscalização satisfatória, senão vejamos:

 

O fiscal do contrato não pode ser responsabilizado, caso não possua condições apropriadas para o desempenho de suas atribuições

Demonstrado nos autos que a responsável pela fiscalização do contrato tinha condições precárias para realizar seu trabalho, elide-se sua responsabilidade”. Foi a essa uma das conclusões a que chegou o TCU ao apreciar recursos de reconsideração em sede, de originariamente, tomada de contas especial, na qual foram julgadas irregulares as contas de diversos responsáveis, relativas à execução do Plano Nacional de Qualificação do Trabalhador (Planfor), no Distrito Federal, no exercício de 1999. No caso, diversas contratações foram efetivadas, e, dentre elas, uma celebrada com o Sindicato Nacional dos Trabalhadores em Sistemas de TV por Assinatura e Serviços Especiais de Telecomunicações (Sincab), na qual se constataram diversas irregularidades graves, algumas delas imputadas à executora técnica do contrato, a quem incumbiria, segundo as normas de execução financeira e orçamentária do DF, supervisionar, fiscalizar e acompanhar a execução da avença, o que não teria sido feito, conforme as apurações iniciais levadas à efeito pelo TCU. Ao examinar a matéria, a unidade instrutiva consignou que o DF não houvera proporcionado à servidora responsável pela fiscalização da avença “condições adequadas para o desempenho de tal função, ao mesmo tempo em que sabia que eventual inexecução do contrato seria de responsabilidade desse executor técnico”. Ademais, ainda para a unidade técnica, os elementos constantes do processo indicariam não serem exequíveis as funções de executor técnico da forma determinada, tendo em conta ser perceptível a impossibilidade de uma única pessoa cumprir todas as funções que lhe foram atribuídas. Em vista da situação, a unidade técnica, com a anuência do relator, propôs a elisão da responsabilidade da recorrente, sem prejuízo da aplicação de penalidades de outros responsáveis pela gestão do Planfor, no DF, ao tempo dos fatos. Nos termos do voto do relator, o Plenário manifestou seu consentimento. Acórdão n.º 839/2011-Plenário, TC-003.118/2001-2, rel. Min. Raimundo Carreiro, 06.04.2011.

 

 

 

                     Ainda em relação às funções do fiscal do contrato, transcrevo a importante decisão do Tribunal de Contas da União acerca da temática em discussão:

 

O fiscal do contrato tem o dever de conhecer os limites e as regras para alterações contratuais definidos na Lei de Licitações, e, por conseguinte, a obrigação de notificar seus superiores sobre a necessidade de realizar o devido aditivo contratual, evitando a atestação da execução de itens não previstos no ajuste, sob pena de ser-lhe aplicada a multa do art. 58, inciso II, da Lei 8.443/92.

Em Auditoria realizada nas obras de construção da Residência para Idosos e reforma da Casa de Transição, em Niterói (RJ), custeadas mediante contrato de repasse com recursos do Departamento Penitenciário Nacional (Depen), foram apontados indícios de irregularidades na conduta do fiscal do contrato destinado à execução das obras. Realizada a audiência do responsável, o relator considerou não elidida a irregularidade relativa ao “pagamento por serviços não previstos no Contrato (...) sem o necessário aditivo contratual, em dissonância com o disposto no art. 60 da Lei 8.666/1993”. Para o relator, embora a falha seja observada frequentemente na execução dos contratos de repasse relacionados a obras em estabelecimentos penitenciários, “o caso em tela denota uma alteração de objeto tão expressiva em relação ao que foi licitado, que não poderia ter sido admitida pelo fiscal do contrato”. Acrescentou que, no caso em exame, 61,3% do valor total acumulado dos boletins de medição equivaleram a itens não previstos no contrato, sendo evidente a responsabilidade do fiscal, o qual teria atestado os boletins sem autorização superior para a execução dos novos itens. Ademais, “a inclusão desses itens deu-se por meio de uma espécie de re-ratificação do contrato feita diretamente nos boletins de medição, sem a formalização do necessário termo aditivo”. Nesse sentido, destacou o relator que “o senso de diligência exigível a um engenheiro fiscal de contrato, aqui considerado sob o conceito de homo medius, impor-lhe-ia o dever de conhecimento dos limites e regras para alterações contratuais definidos no Estatuto de Licitações, e, por conseguinte, a obrigação de notificar seus superiores sobre a necessidade de realizar o necessário aditivo contratual, em respeito à exigência estabelecida no caput do art. 60 da Lei 8.666/93”. Ainda sobre a conduta do fiscal, ressaltou que a gravidade do procedimento adotado, de apenas anotar a alteração diretamente nos boletins de medição, “foi ampliada em virtude da elevada proporção das modificações em relação ao total das medições (mais de 60%)”. Por fim, reforçou que o art. 67 da Lei 8.666/93 impõe ao fiscal do contrato “o dever de notificar seus superiores sobre eventuais ocorrências que extrapolem sua alçada decisória”. Diante do exposto pelo relator, o Tribunal decidiu, no ponto, rejeitar as justificativas apresentadas pelo responsável, aplicando-lhe a multa prevista no inciso II do art. 58 da Lei 8.443/92. Acórdão 43/2015-Plenário, TC 017.261/2011-2, relator Ministro Raimundo Carreiro, 21.1.2015.

 

 

 

                          Como vimos, os contratos administrativos necessitam de um acompanhamento diário e, diante disso, é preciso que os gestores públicos atentem para a necessidade de nomearem fiscais e gestores de contratos devidamente qualificados para a missão, além de propiciarem reais condições para uma fiscalização e acompanhamento eficientes  ao longo da realização de cada contrato em particular. 

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 

BRASIL. Lei Federal nº 8.666/93, de 21 de junho de 1993. Disponível em : http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8666cons.htm. Acesso em :24.05.2016.

BRASIL. Tribunal de Contas da União. Acórdão n° 839/2011 – Plenário. Disponível em:<http://www.tcu.gov.br>. Acesso em: 25.05.2016.

BRASIL. Tribunal de Contas da União. Acórdão n° 43/2015 – Plenário. Disponível em:<http://www.tcu.gov.br>. Acesso em: 25.05.2016.

 

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