É POSSÍVEL A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA COBRAR DAS EMPRESAS PELO ENVIO DOS EDITAIS DE LICITAÇÃO?

23/04/2015 23:51 - Cláudia Pereira
Por Cláudia Cristina de Melo Pereira

                   Não raro me deparo com algum Órgão da Administração Pública dificultando o acesso dos editais de licitação a pretensos licitantes. Tal conduta é, no mínimo, estranha. Recentemente, solicitei por e-mail um edital à Comissão Permanente de Licitação - CPL de determinada Prefeitura do interior de Alagoas. A resposta foi surpreendente, pois o suposto pregoeiro exigia um depósito em sua conta corrente no valor de R$ 120,00 (cento e vinte reais), para que pudesse encaminhar o edital conforme solicitado. Atitudes como essa devem ser coibidas na Administração e denunciadas aos Órgãos de controle Externo. Entendo que é possível a cobrança para se ter acesso aos editais, mas apenas o preço referente exclusivamente às despesas da Administração com a entrega do instrumento editalício. Por exemplo: se o edital é longo e volumoso, com cerca de 80 páginas, a Administração pode perfeitamente cobrar o preço das cópias; afinal, tal cobrança é mais do que justificada.

 

                        Todavia, a cobrança de R$ 120,00 (cento e vinte reais) para um simples envio de edital por e-mail não pode ser encarada como justa ou moral. Outra possibilidade de cobrança para entrega do edital ocorre quando ele é fornecido em Compact Disc (CD), pois em casos assim não se está infringindo nenhum princípio da Administração Pública, uma vez que a aquisição da mídia representa custo para a unidade administrativa.

 

                    A cobrança por edital, em valor superior ao de seu custo de reprodução gráfica, restringe o caráter competitivo do certame. Outro não é o entendimento dos tribunais, senão vejamos:

A cobrança por edital, em valor superior ao do custo de sua reprodução gráfica, e a exigência de demonstração do pagamento dessa taxa, como requisito de habilitação, restringem o caráter competitivo de licitação conduzida por ente do Sistema “S”. Auditoria realizada nos Conselhos Nacionais do Serviço Nacional de Aprendizagem do Transporte – Senat e do Serviço Social do Transporte – Sest avaliou a regularidade de diversos procedimentos licitatórios e de contratos de aquisição de bens e prestação de serviços. A equipe de auditoria identificou, em editais de licitações visando à construção de unidades do Sest/Senat, indícios de restrição à participação de licitantes. Destaquem-se, entre os achados: a) cobrança para obtenção do edital (R$ 1.000,00), em montante superior ao do custo de reprodução do documento e b) exigência, como requisito de habilitação, do comprovante de pagamento pelo edital. O relator, de início, ressaltou que as entidades do Sistema “S” editam regulamentos próprios e estão obrigadas também a observar os princípios gerais que norteiam o processo licitatório e os que regem o funcionamento da Administração Pública. Observou, quanto aos referidos requisitos, que embora o Regulamento de Licitações das citadas entidades não estabeleça limite máximo para o valor a ser cobrado pelo edital de licitação, tal montante deve “ser objetivamente justificado”. Isso, contudo, não se verificou. Fez menção ao art. 2º desse Regulamento, que impõe a busca da proposta mais vantajosa para a entidade e, também, a julgados do Tribunal que consideram “restritiva à competitividade a cobrança por editais em valor superior ao da reprodução gráfica”. Lembrou ainda que a exigência de comprovação de pagamento da taxa de aquisição de edital era classificada, nos respectivos editais, como requisito de qualificação econômico financeira. Ponderou, no entanto, que o citado Regulamento não prevê a possibilidade de sua exigência e que ela permitiria “a prévia identificação de todas as concorrentes”. O Tribunal, então, ao acolher proposta do relator, decidiu determinar ao Senat e ao Sest que, em futuras licitações, abstenham-se de: a) cobrar pela retirada do edital de licitação preço superior ao do custo de sua reprodução gráfica, por prejudicar a competitividade do certame; b) “exigir a comprovação do pagamento de taxa de retirada do edital como requisito de habilitação do licitante, uma vez que esse requisito não é previsto pelo art. 12 do Regulamento de Licitações e Contratos do Sest/Senat”. Precedentes mencionados: Acórdãos ns. 10.992/2011 − 2ª Câmara, 354/2008 − Plenário e 3.056/2008 − 1ª Câmara. Acórdão n.º 2605/2012-Plenário, TC-018.863/2012-4, rel. Min. Marcos Bemquerer Costa, 26.9.2012.

 

            Podemos verificar outros julgados pertinentes à temática, tais como:

 

Acórdão 1834/2010 Plenário

 Também se revela contrária à jurisprudência da Corte e à disposição expressa do § 5º do art. 32 da Lei n. 8.666/1993 a cobrança de valores referentes a fornecimento do edital em patamar superior ao custo efetivo de reprodução gráfica dessa documentação (v. Acórdão n. 2.715/2008 – Plenário).

 

Acórdão 1762/2010 Plenário (Voto do Ministro Relator)

Quanto à disponibilização do edital, evidenciou-se a cobrança de valores para aquisição do edital em desconformidade com o disposto no § 5º do art. 32 da Lei n. 8.666/93. Destaca-se que, por meio de uma análise de diversos avisos de licitação, constata-se que a Prefeitura (...) adota a prática de cobrar a quantia de R$ 500,00 e de R$ 1.000,00 para os editais de tomada de preço e de concorrência respectivamente. Após avaliação do custo efetivo de reprodução gráfica da documentação fornecida, considerando valores atuais, apresentada em planilha de comparação de custos em anexo, evidenciou-se que essa cobrança não guarda relação com o que dispõe a lei de licitações quanto ao tema ("não se exigirá (...) prévio recolhimento de taxas ou emolumentos, salvo os referentes a fornecimento do edital, quando solicitado, com os seus elementos constitutivos, limitados ao valor do custo efetivo de reprodução gráfica da documentação fornecida"). A jurisprudência desse Tribunal tem sido no sentido de que se estabeleça o preço do edital considerando apenas o seu custo de reprodução gráfica, como estipulado no art. 32, § 5º, da Lei de Licitações. Exemplo recente é a determinação desta Corte de Contas, proferida no Acórdão 409/08-P e, no mesmo sentido, os Acórdãos 0354/08-P, 2761/08-2ª Câmara e 2715/08-P.

 

                        Assim, nada obsta que a Administração cobre pelas despesas referentes à entrega do edital convocatório, desde que plena e objetivamente justificados tais valores, sob pena de a cobrança ser reputada restritiva do caráter competitivo da licitação. Ademais, a Lei de Acesso à Informação (Lei nº 12.527/11), garante o pleno acesso gratuito aos editais de licitação, dentre outros documentos referentes à Licitação. A despeito da citada lei, nada impede que o instrumento convocatório esteja concomitantemente disponível na sede do órgão administrativo nem que seja cobrado o valor da sua reprodução gráfica ao interessado, desde que tal valor seja justificado e concernente às despesas efetivamente realizadas pela Administração.

 

 

 

Referências Bibliográficas

 

BRASIL. Lei Federal nº 8.666, de 21 de junho de 1993. 

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8666cons.htm

 

BRASIL. Tribunal de Contas da União. Acórdão n° 2605/2012 – Plenário. Disponível em:<http://www.tcu.gov.br>. Acesso em: 21.04.2015.

 

BRASIL. Tribunal de Contas da União. Acórdão n° 1834/2010 – Plenário. Disponível em:<http://www.tcu.gov.br>. Acesso em: 21.04.2015.

 

BRASIL. Tribunal de Contas da União. Acórdão n° 1762/2010 – Plenário. Disponível em:<http://www.tcu.gov.br>. Acesso em: 21.04.2015.

 

 

 

 

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