Um deputado pode trabalhar pelado?

18/11/2011 05:20 - Balaio do Teles
Por Redação

Olá, pensadores!

Recentemente, o juiz Luis Fernando Camargo de Barros Vidal, da 3ª Vara da Fazenda Pública de São Paulo, capital, prolatou sentença, em ação ajuizada pelo MP paulista, declarando a ilegalidade da verba de R$ 40 mil que cada um dos 94 deputados estaduais recebe, por ano, destinados à compra de itens do vestuário, o chamado “auxílio-paletó”.

A título de informação, o salário de um deputado em São Paulo é de aproximadamente R$ 21 mil. As últimas estimativas de gastos, divulgadas em matéria pelo portal G1.com, apontam que mensalmente cada deputado custe a São Paulo cerca de R$ 100 mil.

O auxílio-paletó seria, na verdade, um 14° e um 15° salários, ferindo de morte a regra constitucional que diz que nos salários percebidos sob a forma de subsídio (art. 39, §4°, CF 1988) não pode incidir qualquer acréscimo de “gratificação, adicional, abono, prêmio, verba de representação ou outra espécie remuneratória”.

O art. 1° da Lei Estadual paulista 11.382/2002 e o regimento interno da ALESP, em seu art. 88, parágrafos 2° a 4°, prevêem o auxílio-paletó como verba indenizatória, ou seja, aquela paga como ressarcimento por um gasto que não deveria ser suportado pelo parlamentar. Em outras palavras, o que os citados diplomas legais dizem é que não é ônus do parlamentar arcar com os gastos das roupas que usa para trabalhar.

A ideia da indenização é totalmente diferente, todos sabem. Deve ser indenizado aquele que, não tendo que suportar determinado ônus financeiro, suporta-o em detrimento exclusivamente da função. Por exemplo, alguém que viaja a serviço deve ser indenizado com os gastos com transporte e hospedagem. Do mesmo modo, quem se alimenta, às suas expensas, devido à extensão da jornada de trabalho, também deve ser ressarcido.

O problema com o auxílio-paletó é que ninguém, a menos que trabalhe em algum tipo de praia de nudismo, trabalha pelado. Vestir-se é ônus natural de qualquer ser humano que habite e conviva na sociedade de hoje. Como dizer que isso não é ônus de cada parlamentar, pessoalmente? Um deputado pode trabalhar pelado?

Se a justificativa para o auxílio-paletó for a de que um deputado deve estar sempre "bem vestido", estou certo de que só usa ternos Armani, Dior, Balmain ou Yves Saint Laurent quem está disposto a pagar, com seus recursos próprios, por eles. Para exercer a função parlamentar, não se exige grife, nem marca. Aliás, respeitada a solenidade da função, não se exige nem terno. Quem vivia de pompa era a realeza medieval, suas perucas e suas roupas em fio de ouro. Esse tempo, meus caros paralamentares, já passou.

Se os senhores, como trabalhadores, acham justa a concessão da verba para si, tenho uma sugestão e um pedido: ampliem, pela via legislativa, o benefício a todos os trabalhadores! Obriguem o Governo e a classe patronal a pagarem auxílio vestuário, independentemente do salário, para professores, para profissionais da saúde, para os empregados das empresas, etc. Estou falando em roupa mesmo e não em equipamento de proteção ou vestimenta especial. Afinal, todos estes, a meu sentir, também devem trabalhar bem vestidos!

Além de inconstitucional, a concessão do auxílio-paletó ofende a moralidade e o senso de comunidade e zelo para com as verbas públicas que deveria estar presente em cada representante popular. Sei que tal argumento soa piegas e romântico, afinal a avassaladora maioria dos deputados está mesmo interessada em encher os bolsos dos paletós que sequer pagaram. Porém, a cada decisão como esta proferida pela justiça paulista, é como se, no fundo da minha consciência, algo me dissesse que ainda há um fio de esperança para essa terra tupiniquim e para os homens de bem que nela habitam. 

 

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