Outsider. Marginal. Rebelde. Agitador. Subversivo. Iconoclasta. Antissistema. Aparentados, esses termos desfrutam de boa reputação quando falamos de arte. Quebrar regras, pegar a contramão e desafiar a ordem são atitudes do fora de série, dos verdadeiros criadores. Glauber Rocha no cinema e Augusto de Campos na poesia são associados a essas categorias – ainda que haja controvérsias na classificação.
Tudo muda quando migramos para o mundo da política, porque aí o farsesco invade a sala. Historicamente, os que se apresentam como inimigos do sistema são tipos da pior qualidade. Na verdade, nesses casos a suposta contestação da ordem não passa de firula retórica. Toda vez que pinta uma figura prometendo “mudar tudo isso que aí está”, podemos apostar sem medo: é um farsante a galope, apto a degradar a política.
Os tempos atuais nos deram Trump, Bolsonaro e Milei. Rebeldes de araque. A ascensão da ultradireita requentou a fantasia do político antissistema. Paradoxo desconcertante é que todos os que assim se apresentam evidenciam que são exatamente o contrário do que dizem. Os quatro anos de Bolsonaro na Presidência são a prova definitiva dessa enganação. Nunca houve um presidente mais aboletado com o sistema do que o “mito”.
O desgoverno do capitão da tortura consagrou os arranjos à base da corrupção. Acordos políticos foram fechados pela via do fisiologismo, da troca de favores e da compra do Congresso Nacional. Foi nesse período pavoroso que se inaugurou no país o chamado orçamento secreto – para felicidade de Arthur Lira e seus parceiros. Pois toda essa engenharia acanalhada teve como grande protagonista o Bolsonaro “antissistema”.
Numa sequência devastadora dessa tradição, o mais novo iconoclasta da velha política, decidido a tudo mudar, é Pablo Marçal, candidato a prefeito de São Paulo. Picareta condenado por roubo, um desclassificado sob todas as variáveis catalogáveis, eis mais um grande modelo apresentado pelos “conservadores” à vida pública brasileira. A presepada é tão evidente, mas encontra apoio no desolado solo mental da humanidade.