Arthur Lira é atropelado por uma palavra

29/04/2024 00:21 - Blog do Celio Gomes
Por redação
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O Aurélio e o Houaiss não registram o verbete. Em tempos de dancinhas, memes e emojis, no Império da Imagem não há chance para o verbo. O diagnóstico não é de hoje. Essa oposição está no centro de debates que atravessam os séculos, com idas e vindas de argumentos e sentenças, sem perspectiva de acordo. Tudo isso para dizer que Arthur Lira foi atropelado por uma palavra – e que doideira: uma palavra que nem existe.

Com a devida vênia ao presidente da Câmara dos Deputados, o alagoano trincou os dentes ao receber o tratamento de “excrementíssimo”. O autor da inusitada categorização do parlamentar foi o youtuber Felipe Neto. Recorrendo a um neologismo, o influenciador que caiu nas graças da esquerda deixou Lira bem irritado. Tão irritado que decidiu por uma reação despropositada: chamou a Polícia Legislativa.

É direito de qualquer um reagir a um insulto, inclusive recorrendo à Justiça. No caso, o parlamentar se diz vítima de injúria, e por isso quer uma punição para seu agressor. Sem dúvida, associar alguém a excremento não é exatamente um ato de delicadeza. Mas e a liberdade de expressão, como é que fica? Sob o manto da imunidade de fala, integrantes do parlamento vivem distribuindo agressões verbais de baixo nível a desafetos.

Nos últimos dias, Lira travou o andamento do projeto de lei que prevê a regulação das plataformas digitais. Para ele e outros de seus pares, há o perigo de censura ao direito da livre manifestação de pensamento. Essa ideia, no entanto, não combina com a ira do deputado contra Felipe Neto. Posar de libertário quando o alvo são os outros é moleza. Quando se viu na mira do deboche, o ilustríssimo apontou um crime.

É discutível a legitimidade do ato de Lira, ao acionar a Polícia Legislativa da Câmara para cuidar do episódio. Paira a sombra do autoritarismo e do desvio de função de um órgão de Estado. Por mais grosseiro que seja, o termo usado pelo influenciador não constitui ameaça nenhuma ao Poder Legislativo. O deputado parece tratar esse departamento policial como sua tropa particular. É uma confusão mais que temerária.

Além de tudo isso, a extravagância do ofendido tem o efeito contrário ao que ele pretendia. Ao fazer estardalhaço com a fala que julga injuriosa, expõe um pouco mais sua índole beligerante e amplia os estragos da piada contra si. Um dado se mostra evidente: a maré não anda boa para Sua Excelência.

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