O juiz alagoano Pedro Jorge Melro Cansanção está sendo acusado por associações do estado do Pará de atuar de forma arbitrária em favor do Grupo Marroquim. O caso foi parar na Corregedoria-Geral de Justiça, que viu indícios de irregularidade em atos, como um bloqueio de R$ 21,3 milhões das associações, o que foi considerado não razoável. Quem comanda o grupo é Mário Marroquim Neto, empresário que atualmente também é presidente do CRB.
As associações são formadas por proprietários de unidades de edifícios residenciais em Belém, construídos pela empresa alagoana, que se sentiram lesados pela Marroquim.
Segundo alegaram na justiça, a construtora alagoana teria implementado uma espécie de "esquema", que envolvia a contratação e recontratação de funcionários em nome das associações, além da falta de pagamento trabalhistas e tributários para os funcionários, e o não repasse de dinheiro às associações e obras inacabadas.
Ainda segundo as associações, quando os imóveis eram entregues, a empresa não fazia regularização no cartório.
Ação em Alagoas
Em busca de ajuda, as associações acionaram a Justiça de Alagoas para tentar barrar a recuperação judicial da empresa. A ideia seria fazer com que o Judiciário reconhecesse a Marroquim Engenharia como um único grupo, incluindo os grupos que fizeram as contrações em Belém.
No caso, as empresas envolvidas são a Marroquim Engenharia Ltda.; a Marroquim Junior Construções e Projetos Ltda., a Marroquim Consultoria Empresarial Ltda.
A alegação das associações é que as empresas Marroquim Junior Construções e Projetos Ltda e Marroquim Engenharia Ltda formam o mesmo grupo, com os mesmos administradores e sócios.
Juiz nega a liminar
Só que a história ganhou um capítulo. O juiz alagoano Pedro Jorge Melro Cansanção negou a liminar pedida pelas associações em favor da empresa Marroquim. Mais que isso: disse que as associações cometeram atos criminosos.
“Os atos criminosos, falsos, levianos e ilegais destas associações destruíram centenas de empregos gerados pela empresa e a levaram a distratar contratos à época em vigor, como os dos empreendimentos Villa dos Pescadores, Vila Passione e Piazza Verona, cujos distratos foram homologados por esse Juízo nos autos do Pedido de Recuperação Judicial, causando na Autora um inestimável dano à sua honra e imagem”, disse o juiz em sua decisão.
Na época, o magistrado mandou bloquear as contas bancárias das Associações para garantir o pagamento de eventual e provável condenação pelos danos morais causados a Marroquim.
Corregedor critica
O caso revoltou as associações, que denunciaram o juiz à Corregedoria do TJ-AL (Tribunal de Justiça de Alagoas).
No dia 5 de julho, o corregedor-geral da Justiça, desembargador Fábio José Bittencourt Araújo, acolheu o pedido e enviou o caso para o Pleno do TJ-AL para instaurar um procedimento administrativo disciplinar para investigar a conduta do magistrado.
O Cada Minuto teve acesso a decisão da Corregedoria. Segundo o documento, as associações narram que o magistrado teria agido de forma arbitrária para beneficiar a Marroquim.
Os argumentos das associações foram acolhidos. Na decisão, o desembargador afirma ver como suspeita e agressiva na ação do juiz no caso.
"Como se nota além de ter rogado ofensas contra as partes rés sem ao menos ouvi-las previamente, o juiz requerido sob o pretexto de proferir uma decisão de 'tutela provisória' basicamente julgou antecipadamente a lide ao reconhecer a ilegalidade das condutas imputadas às rés. Ora, reclamantes, reconhecendo a necessidade destas últimas ao pagamento de indenização por danos morais e, na mesma oportunidade, o bloqueio milionário de quantia suficiente para abarcar a futura condenação”, diz o Corregedor em um trecho da decisão.
Ele cita que não só o magistrado indeferiu o ingresso das associações como interessadas, como as condenou ao pagamento de multa por "litigância de má-fé" e honorários advocatícios, determinando um bloqueio de R$ 21.390.950,00 das associações.
"Nota-se desse modo um completo desprezo pelo sistema processual vigente e principalmente aos princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa, indiscutivelmente maculados e ignorados pelo magistrado requerido”, reforça o desembargador.
O corregedor-Geral pede a apuração da seguinte conduta: suposta prática de infração funcional por violação dos princípios da legalidade, da imparcialidade, da isonomia, da cautela, prudência e cortesia, além de não cumprir e fazer cumprir, com independência, serenidade e exatidão, as disposições legais, acarretando o provável descumprimento de seus deveres funcionais quando da condução das ações judiciais.
Além disso, o juiz determinou oficiou o Ministério Público Estadual e à Polícia Civil de Alagoas para que apurem eventual prática ilícita ou fraude processual.
Na decisão também consta que o juiz afirmou ter consciência de que não cometeu nenhuma arbitrariedade e que agiu dentro do íntimo da legalidade. “Proferiu decisões fundamentadas e em nenhum momento descumpriu ordens da Instância Superior, que prejudicassem ou favorecessem as partes”.
O julgamento do caso no pleno está marcado para o próximo dia 14 de setembro.
Procurada, a defesa da Marroquim afirmou que não iria se posicionar porque não teve acesso à decisão. Já o advogado das associações disse que só iria se pronunciar após o julgamento. A reportagem também entrou em contato com a assessoria de comunicação do Tribunal de Justiça de Alagoas para ouvir a versão do juiz que não respondeu a demanda.