A essa altura, parece claro que não passa de fantasia a versão apresentada pelo Aeroclube de Alagoas, de que o cantor Gabriel Diniz viajava numa “carona” no avião que caiu em Sergipe. Primeiro foi o pai do próprio cantor, Felipe Diniz, que desmentiu a informação, numa entrevista à Record TV, ainda na noite desta segunda-feira. Como destaquei no texto anterior, o pai do artista garantiu: Esse avião foi fretado aqui em Alagoas para fazer o translado dele [Gabriel Diniz] para Salvador. Retornaria para cá, para Alagoas, no mesmo avião... Um avião locado, fretado para fazer essa atividade.

Ocorre que a aeronave não tinha autorização legal para o serviço de táxi aéreo; era destinada exclusivamente para instrução de pilotos. A Agência Nacional de Aviação Civil suspendeu as atividades do aeroclube. No acidente morreram o cantor e os pilotos Abraão Farias e Linaldo Xavier. Eles retornavam da Bahia para Alagoas, onde Gabriel Diniz participaria do aniversário da namorada.

Na manhã desta terça-feira, o enredo divulgado pelos diretores do aeroclube ficou ainda mais desmoralizado com a declaração do senhor Erivaldo Farias, pai de Abraão, um dos pilotos mortos na tragédia. Ao portal Gazetaweb, disse ele: Isso, de que era carona, é conversa fiada. Era um voo fretado. Tinha sido 4 mil reais para fazer a viagem pra levar o cantor ao show e trazê-lo para Maceió. O valor cobrado por um voo desses é maior, mas, como eles eram amigos, cobrou só esse valor.

Confrontada com o que dizem duas pessoas que desmentem a história da “carona”, a direção do aeroclube sustenta que a aeronave não fazia táxi aéreo. Mais: segundo o CADAMINUTO, a empresa diz agora que, se houve acordo, foi feito diretamente entre o cantor e o piloto. Ou seja: mantém a narrativa sem pé nem cabeça e, pelo visto, ensaia jogar a culpa nos mortos. Difícil.

Chamou minha atenção um trecho da entrevista do diretor de materiais do aeroclube, Jefferson dos Santos Silva, à TV Gazeta, na noite da segunda: Como o Abraão [piloto morto no acidente] é diretor, e o Xavier [o outro piloto morto] também é diretor aqui no Aeroclube, ambos têm direito, assim como eu, de pegar o avião a hora que quiser para fazer voo aqui em Maceió, voos de rota, porque é regulamento do aeroclube, entendeu?”. Não.

O que não entendi foi esse “pegar o avião a hora que quiser”. Falando assim, até parece que o Aeroclube de Alagoas nada em dinheiro, a ponto de seus diretores gozarem de um incrível privilégio. Basta querer passear, e eles vão lá e pegam uma aeronave! Não conheço nenhuma empresa no mundo com essa metodologia de gestão. Não faz o menor sentido. A única explicação é que, na ânsia de emplacar a conversa da “carona”, o diretor foi tão exagerado, que falou bobagem.

O acidente começa a ser investigado pela Anac. Geralmente é coisa pra pelo menos um ano de trabalho. É tudo muito complexo, é verdade. Agora, desvendar se o Aeroclube de Alagoas pratica ou não voos ilegais é algo que pode ser esclarecido bem mais rápido. Como está claro, já existem no mínimo duas importantes testemunhas – que são os pais de duas das vítimas da tragédia.