Um eleitor chamado “Mercado”

11/06/2018 15:54 - Blog do Celio Gomes
Por Redação

Quem decide a eleição é o voto do eleitor. Mais ou menos. Digo isso porque se os candidatos a presidente dedicam tanto empenho para conquistar a preferência de todos nós, o esforço não é menor para ganhar o apoio de Sua Excelência, o Mercado. Tanto faz se o postulante a governar reza na cartilha do mais romântico marxismo ou é um adepto das firulas neoliberais – sem a confiança do mercado, é bronca. Alguns tentam disfarçar, mas a reverência a essa entidade é a marca de todos.

 

Desde a redemocratização, quando recuperamos o direito de eleger diretamente o governante do país, a cada quatro anos o debate está de volta. Vamos lembrar da primeira eleição de Luiz Inácio Lula da Silva, em 2002. Você está cansado de ouvir aquela explicação – mais repetida que a gíria “pistola” hoje em dia: o petista só ganhou a disputa sobre José Serra após publicar a famosa Carta aos Brasileiros. Na real, o nome mais preciso deveria ser Carta ao Mercado. Foi tudo isso mesmo?

 

Não importa. O fato é que a ideia virou uma verdade absoluta. E nas eleições de 2018, quem é o favorito do sistema financeiro? Ninguém assume tal condição. Nenhum dos candidatos, por mais queridinho que seja entre megaempresários e banqueiros, sai do armário para admitir a condição um tanto inconveniente. Todos garantem ao eleitorado que são “independentes”.

 

Quando cai a noite, é outra conversa. De Ciro Gomes a Guilherme Boulos; de Jair Bolsonaro a Marina Silva, os presidenciáveis falam grosso nos palanques para plateias aliadas, mas afinam em sabatinas para o público dono do dinheiro. Por isso, é altamente arriscado cravar certezas sobre as intenções dos que estão aí pedindo o seu voto. Depois da eleição, a surpresa pode ser arrasadora.

 

O caso Marina Silva em 2014 é emblemático. Após assumir a liderança na corrida, com muita chance de vitória, caiu na armadilha do PT. A proposta marinista de um Banco Central independente foi transformada, pela campanha petista na TV, em sinônimo de fome na casa do brasileiro. Em dois tempos, os votos evaporaram. Reeleita, Dilma fez tudo o que condenara em sua adversária.

 

No atual processo eleitoral, a situação mais inusitada é a de Bolsonaro. Ignorante completo em economia, sempre foi um ferrenho defensor do mais jurássico estatismo. Agora, milagrosamente, morrendo de medo das forças ocultas do mercado, virou liberal desde criancinha. Para se enfeitar de moderno candidato do liberalismo, se agarrou a Paulo Guedes, um radical das privatizações.

 

O economista Guedes é um velho amigão de especuladores, sócio de bancos e guru desses antros de lobistas chamados de “consultorias”. O homem foi um dos formuladores do programa de governo de Guilherme Afif Domingos, presidenciável na remota eleição de 1989. Três décadas depois, está de volta como o ideólogo bolsonarista no campo da macroeconomia. Nada de novo no Brasil.

 

Dá pra levar a sério? É claro que não, mas está aí a prova da influência mortal que o tal do mercado exerce nos rumos de uma eleição. Nosso voto é decisivo, não resta dúvida, mas os candidatos se ajoelham mesmo é diante dos senhores da grana. Até o valentão adepto do fuzil e da tortura vira um gatinho manso no colo do sistema financeiro. Direita? Esquerda? Que nada; isso é só fantasia.

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