Mergulhado na confusão patrocinada por caminhoneiros – e também por políticos e empresários –, o Brasil pega fogo. A greve sobre rodas provoca falta de combustível nos postos e desabastecimento dos mercados e centrais de distribuição de alimentos. As maiores vítimas, é claro, são os brasileiros que habitam o país real. Sem alternativas, ficamos reféns dos fatos até agora imprevisíveis.
Enquanto isso, no país da fantasia, na dimensão paralela dos privilégios indecentes, Maceió sedia até este sábado o Congresso Brasileiro de Magistrados. Sempre antenados com os problemas que atingem em cheio a população, togados brincam de debate com objetivos de inquestionável relevância para os destinos de uma nação. Uma pena que o sol se escondeu. Não vai rolar a praia.
Leio que estão por aqui até a presidente do STF e o ministro Dias Toffoli. A multidão de doutores que veio passear em nossa capital recebeu uma notícia frustrante: por causa da bagaceira total, a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, cancelou sua participação no congresso. Aliás, esse incidente deve ser a única consequência da greve que incomodou a juizada brasileira. Que chato!
O convescote ocorre no centro de convenções. Por lá, certamente são ouvidos discursos inflamados que denunciam a perseguição ao exemplar Judiciário nacional. Também há muito palavrório em defesa das ações de combate à corrupção. Afinal de contas esse é um poder que tem tudo a nos ensinar sobre lisura, honestidade e imparcialidade. Ninguém duvida disso.
Espero que caminhoneiros desavisados não inventem de atrapalhar os magistrados em seu direito de ir e vir. Eles costumam se implacáveis no cumprimento da lei e no respeito à ordem pública – mais ainda quando são afetados diretamente. Uma canetada, e até o caminhão será algemado.
Seria sensacional se a categoria promovesse um painel para debater o auxílio-moradia e os demais auxílios para tudo, que são exclusividade desses heróis da pátria. Poderiam aproveitar para esclarecer sobre os custos de um fim de semana no paraíso das águas. Mas isso jamais acontecerá.
Nossa grande imprensa não vai incomodar os brilhantes juristas com essas pautas sem noção. Isso é coisa de quem pretende, como eu, sabotar o precioso trabalho da categoria que se considera intocável. O certo é exibir belas fotos e imagens que homenageiam a turma que tanto luta pelo Brasil.
Não deixa de ser uma coincidência por demais reveladora que essa festinha particular ocorra justamente agora. A qualidade da República brasileira pode ser sintetizada nesta dualidade: as ruas conflagradas e o luxo dos ambientes blindados em que uma elite troca salamaleques entre os seus.
Dito isso, com a máxima vênia, informo a suas excelências e aos leitores meu ponto de vista resumido aqui. Afinal, desacato dá até prisão. Espero que aceitem esta singela divergência!