A criminosa investigação do crime

10/05/2018 19:17 - Blog do Celio Gomes
Por Redação

A Polícia Federal concluiu a investigação sobre um suposto desvio de verba na Universidade Federal de Santa Catarina. É aquele caso em que o reitor Luiz Carlos Cancellier cometeu suicídio, após ser apontado como um dos responsáveis pelo esquema. A Veja antecipou o relatório na semana passada. Hoje, a Folha de S. Paulo também traz reportagem sobre o desfecho das investigações da PF. E o que temos na praça é algo realmente criminoso: o relatório é uma grande porcaria.

 

Como ressalta a Folha, são 817 páginas – e nenhuma prova, nenhum indício, nada que demonstre a culpa do reitor. Ainda assim, de maneira sórdida, os investigadores sustentam a versão inicial e apontam ligação do ex-reitor com os fatos. Está claro que a PF errou, e muito, mas falta dignidade para admitir o conjunto de falhas grosseiras. Procurada pela reportagem, a superintendência do órgão em SC saiu-se com resposta ridícula: “Investigação encerrada”.

 

Cancellier só não está indiciado porque está morto. E o que acontece agora? As baboseiras alinhavadas em centenas de páginas seguem para o Ministério Público, que decidirá se oferece ou não denúncia contra os citados. Pelo visto, acostumados com o vale-tudo da Lava Jato, celerados na PF não cogitam outra decisão que não seja a denúncia. Como o MPF adotou a mesma sanha justiceira – afinal basta um power point como "prova" cabal e incontestável –, não será surpresa nenhuma se a patetice avançar mais um degrau.

 

O que está na origem dessa filosofia é algo bem ajeitado na cabeça de muitas autoridades, embora jamais tenham a coragem de admitir, por razões óbvias: para investigar, podemos atropelar os limites da legalidade. Esse é ponto. Sei que, aqui mesmo em Alagoas, candidatos a xerife e a herói nutrem desprezo por princípios que consideram apenas empecilhos às suas exibições de valentia. São agentes da lei que, em nome do combate ao crime, adotam ações também criminosas.

 

Nos últimos anos, essa modalidade investigativa alcançou alturas jamais cogitadas no país. O espírito beligerante dos indignados de fachada ou dos idiotas úteis alimenta a fúria sanguinolenta de policiais, promotores e juízes. Mais que isso, acaba por legitimar atos cuja legitimidade está abaixo de zero. Quando a autoridade se considera acima das leis, podemos encomendar o caixão. Já era.

 

Mas é justamente sob a inspiração desse discurso, do prendo & arrebento & estraçalho, que uma multidão de “cidadãos de bem” está mobilizada para dar um jeito no Brasil. É muita onda... Talvez por que nunca tenha sido fã de heróis dos quadrinhos ou de fanfarrões do cinema, comigo isso não cola. Quem rasga o processo legal é só um criminoso – seja togado, fardado ou engravatado.

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