O Exército contra a democracia: a fala descabida do comandante

04/04/2018 05:50 - Blog do Celio Gomes
Por Redação

Se há duas coisas historicamente incompatíveis no Brasil, desde a queda do Império, são o Exército e a democracia. A República nasceu, como se sabe, com um golpe militar, e essa tradição chegou ao ápice com a ditadura instalada em 1964. Por isso, as mensagens do comandante Eduardo Villas Bôas parecem mesmo um aceno a ações nada democráticas no panorama que vivemos hoje.

 

Na noite desta terça-feira, às vésperas do julgamento pelo STF do habeas corpus em favor de Lula, o militar escreveu em rede social: Asseguro à Nação que o Exército Brasileiro julga compartilhar o anseio de todos os cidadãos de bem de repúdio à impunidade e de respeito à Constituição, à paz social e à Democracia, bem como se mantém atento às suas missões institucionais.

     

Nada mais obscuro que um general no comando da tropa vir a público se manifestar de forma um tanto ameaçadora contra a ordem legal do país. É uma pressão descabida contra a suprema corte da nação. Que história é essa de o Exército compartilhar com o “cidadão de bem” o que ele chama de “repúdio à impunidade”? É a força bruta querendo impor sua vontade a qualquer jeito.

 

Para ficarmos no período entre 1964 e 1985, nos 21 anos de regime militar, o Exército representou tudo, menos respeito à democracia e à Constituição. É exatamente o contrário do que diz o general. A ação das Forças Armadas durante a ditadura significou a pior quadra na vida brasileira. Só para não esquecer: torturas, desaparecimentos e assassinatos resumem o legado de terror.

 

No fim do seu inaceitável recado, o comandante solta a sombria lorota. Diz ele que o Exército “está atento às suas missões institucionais”. Que missões seriam essas? Intervir no processo político? Fechar o Congresso Nacional? Decretar a censura à imprensa? Cassar o mandato de políticos eleitos pelo voto popular? Eliminar “subversivos”? Essas missões o Exército de fato conhece bem.

 

Lembro aqui de algo deplorável, que ainda ocorre nos quartéis pelo Brasil afora. A cada 31 de março, muitos comandos regionais do Exército comemoram o aniversário do que para eles é a “Revolução de 64”. Um ataque mortal contra as liberdades em geral e contra a democracia é festejado como se celebrassem algo nobre. Trata-se de uma ofensa em todos os sentidos.

 

Como se vê, o “cidadão de bem” conta até com o apoio de generais para botar o sapo barbudo na cadeia. Seja qual for a decisão do STF, espera-se que os ministros votem com a Constituição. E com coragem. Porque não resta dúvida de que as palavras do comandante acenam para a covardia. Três décadas após o fim da ditadura, o Brasil mudou demais – ainda que tantos continuem no passado.

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