Passeando às custas do povo

31/03/2018 20:05 - Blog do Celio Gomes
Por Redação

Em dezembro de 2013, o senador Renan Calheiros viajou de Brasília até o Recife para uma importante missão como presidente do Congresso Nacional: foi dar uma turbinada em sua cabeleira. Depois do bem-sucedido implante capilar, descobriu-se que a viagem entre a capital do país e a terra do Mangue Beat tinha sido feita num avião da FAB. Ou seja, eu e você pagamos pela cirurgia republicana do pai do governador Renanzinho. Após a revelação dos fatos, Renan ressarciu os cofres da União.

 

Um dia desses, o ministro do Supremo Tribunal Federal Gilmar Mendes partiu para Fortaleza, onde era convidado especial no casamento de uma enteada. Para viabilizar o deslocamento, ele usou a cota de passagens aéreas a que tem direito como integrante do STF. Naturalmente, os togados devem recorrer à cota para missões oficiais. Casamentos, batizados e confraternizações em geral não estão entre eventos previstos como ação de trabalho.

 

O mesmo Gilmar Mendes acaba de se meter em outra presepada envolvendo viagens às custas do contribuinte. Ele foi a Portugal para falar num seminário do Instituto Brasileiro de Direito Público, que tem entre seus donos o próprio ministro. Um repórter da Folha perguntou quem pagou as passagens. A esclarecedora resposta do togado foi esta: Devolva essa pergunta a seu editor, manda ele enfiar isso na bunda. Isso é molecagem, esse tipo de pergunta é desrespeito.

 

No dia 22 de março, o julgamento do habeas corpus em favor de Lula foi suspenso em função de um compromisso particular do ministro Marco Aurélio Mello. Ele informou que não poderia perder o voo para o Rio de Janeiro, onde daria uma palestra para uma patota do mundo jurídico. Não bastasse o insulto de priorizar uma agenda pessoal em detrimento de suas obrigações oficiais, o ministro faz piada com a suspeita de que o passeio também saiu às custas do tribunal supremo.

 

Em outubro do ano passado, o tosco presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, foi vagabundear por três países, acompanhado pela mulher e outros nove comparsas do Congresso. A farra em Portugal, Itália e Israel teve todos os custos bancados pela Câmara. Para ganhar os ares, claro que o grupo também teve uma aeronave da FAB à disposição. A explicação de fachada para a esbórnia internacional foi que a viagem serviu de intercâmbio e “troca de experiências”.

 

É uma de nossas mais arraigadas tradições. O mundo se transforma, a terra já é plana, mas esse tipo de bandalheira atravessa os tempos – sem perigo de um dia acabar. E veja: o mal percorre todas as instâncias e esferas da vida pública, sem distinção de posto, nos três poderes da República. Eu diria que é praticamente uma guerra perdida tentar varrer para o lixo essa prática deletéria. Se eu fosse um revolucionário, simpático a radicalismos, defenderia o paredão ou a guilhotina. Mas sou da paz.

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