Rolando Lero escreveu nota da Ufal

30/03/2018 02:58 - Blog do Celio Gomes
Por Redação

Esta é a terra de Graciliano Ramos. O autor de obras-primas absolutas – como São Bernardo e Memórias do Cárcere – construiu um monumento literário incomparável. Se na panelinha de doutores da USP, Machado e Guimarães são sempre citados como os maiores, isso se deve muito mais, penso eu, ao oba-oba provinciano que arrasta até supostos especialistas no assunto.

 

Ao contrário do carioca Machado, você não encontra um texto de Graciliano com enredo inconsistente nem vírgulas fora do lugar. Já na comparação com Guimarães, nada mais distante do alagoano do que aquela verborragia com um tanto de afetação que marca a escrita do autor mineiro. Graciliano – digo sem perigo de errar – reinventa a linguagem na literatura brasileira.

                                               

Mas isto aqui não é uma resenha sobre escritores. Fui levado a essa divagação depois de ler a nota da Universidade Federal de Alagoas sobre falta de segurança no local. Como informa este site, a Reitoria se manifestou depois de mais um caso de assalto no campus da Ufal. A nota é um atentado contra o idioma, num palavreado cheio de embromação e erros. Destaco um trecho:

 

O Conselho Universitário (Consuni) reuniu-se no último dia 19 e debateu longamente a temática no sentido de construir soluções consensuadas pela comunidade universitária. Sabe-se dos números relacionados à violência no país e no estado e a Reitoria, como qualquer gestão responsável faria, considera estes dados para subsidiar o enfrentamento da questão.

 

Suspeito que o redator da universidade psicografou o texto acima do erudito Rolando Lero, que ficou famoso na Escolinha do Professor Raimundo. Não bastasse a dança psicodélica na pontuação, o autor alcança o pós-dadaísmo ao perpetrar o que chama de “soluções consensuadas”. A palavra “consensuar” é um verbo inexistente na língua portuguesa. Não está dicionarizado entre nós. É um cacoete no jargão de certas categorias profissionais, uma vã tentativa de erudição. Nunca dá certo.

 

No todo, a qualidade da nota acaba por revelar aquilo que a instituição pretende disfarçar: a universidade não tem o que dizer sobre medidas concretas para dar segurança a professores, estudantes e funcionários. Tudo o que temos como providência é reunião depois de reunião. E vejam que o texto ainda vem com essa história de números da violência no estado e no país. É uma evidente manipulação dos fatos para fugir da responsabilidade. Uma tática consagrada.

 

A fase não é de sorte na Ufal. Outra notícia trata de obras paradas no campus. A foto que ilustra a matéria do CADAMINUTO mostra uma faixa na entrada da universidade, com a seguinte saudação: Sejam bem vindos/as à maior universidade pública, gratuita e socialmente referenciada de Alagoas! #SomosTodosUfal. Faltou o hífen para bem-vindos, como acabo de escrever. A moda de usar uma barra (os/as) para contemplar os dois gêneros é macaquice ideológica.

 

E o que seria uma universidade “socialmente referenciada”? Isso não quer dizer absolutamente bulhufas – é uma fraude intelectual. A nota sobre os casos de violência e a mensagem na faixa são produtos de um jurássico delírio esquerdista. Está tudo de acordo com o currículo da reitora Valéria Correia e, de resto, dos luminares da academia. E pensar que estamos falando da elite de nossa educação, o ensino de nível superior no país. Esse é o nosso padrão de alta cultura.

 

A universidade não é célula partidária, não é lugar para doutrinação e proselitismo de quinta categoria. Com todo respeito à reitora e a seus pares, recomendo que deixem um pouco de lado os manuais stalinistas e os “textões” nas redes sociais – e dediquem alguma leitura a Graciliano. Além de não fazer mal à saúde, pode melhorar imensamente esse estranho idioma praticado por aí.

 

                                                                            X  X  X 

 

Respondo ao leitor Wilmo Francisco. Boa, meu caro! É claro que errei. Saiu no automático. Demorei a corrigir a lambança, mas o texto já está atualizado. Não sei o que deu na minha cabeça. Além do efeito da madrugada, acho que troquei algum ingrediente no meu chá alucinógeno. Quanto a pretender o posto de intelectual, isso nunca. Não tenho o talento e a bagagem dos doutores da Ufal e da USP.

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