Quanto vale uma delação premiada?

06/09/2017 03:45 - Blog do Celio Gomes
Por Redação

A expressão “delação premiada” entrou para o vocabulário do Brasil com as sucessivas e cada vez mais frequentes operações da Polícia Federal, todas batizadas com nomes infalivelmente cheios de exotismo. Mas a novidade começou mesmo a sacudir o país – como um terremoto que se vê até hoje –, de 2014 para cá, quando a Lava Jato passou a monopolizar as manchetes.

Desde então, a eficácia, os méritos e, principalmente, a legitimidade desse mecanismo de investigação têm sido debatidos e, não raro, postos em xeque. Há boas razões para isso, embora a experiência da colaboração de criminosos confessos seja algo consagrado em vários países. A Itália é apenas o caso mais lembrado.

Os exemplos de delatores que mentiram em seus relatos e voltaram à delinquência mostram que há, sim, margem para o fiasco de investigações. Quando isso ocorre, os prejuízos são irreparáveis, porque, afinal, inocentes podem ser punidos severamente enquanto bandidos ficam livres, com o aval absoluto das esferas superiores da Justiça.

Outro complicador é que, para muita gente, investigadores – no Ministério Público e na Polícia Federal – estão viciados em colaboração premiada; ou seja, de meio para a obtenção de provas, o recurso acabou ganhando o status de prova em si mesmo.

Fenômeno idêntico, e mais antigo, ocorre com a interceptação telefônica. Na busca por elementos que incriminem suspeitos, uma conversa gravada virou fetiche para policiais e promotores. Não é por acaso que telefones são grampeados nos quatro cantos do país, 24 horas por dia e, incontáveis vezes, sem que isso tenha autorização judicial.

Agora, junte uma rede de grampos clandestinos (ou mesmo autorizados legalmente) e um coletivo de delatores dispostos a tudo para escapar da cadeia: o que teremos? Uma operação com potencial de alto risco para o processo legal. É o cenário perfeito para a fabricação de provas ilegais.

Uma vez que colaboração premiada e gravações telefônicas estão previstas como práticas legais de investigação, a única coisa a fazer é trabalhar com esses recursos de maneira rigorosa e zelo extremo. Mas esse comportamento obrigatório, ao que parece, tem sido ignorado com ferocidade onde deveria ser tratado com o peso de um mandamento sagrado. Nesse sentido, a aberração do caso MPF-JBS talvez tenha um efeito pedagógico.

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