Brasil: procura-se um santo

14/03/2016 16:12 - Diálogos e Debate
Por Diálogos & Debate

          O Brasil chegou ao pior dos consensos e a pior das divergências. O consenso em torno de um projeto econômico que já não é mais objeto de discussão pelos atores políticos, nos leva a discutir apenas que partido ou coalisão teria mais capital político para implementá-lo.

                A divergência, portanto, assume um caráter inócuo e subjetivo na medida em que não estamos mais debatendo um projeto de país e sim, quem vai implantar um programa e uma agenda que é supostamente o produto de um consenso nacional.

É forçosamente, nesses momentos, que uma sociedade reduz o debate político a uma questão meramente moral.

          Quando um debate político se reduz aos aspectos morais numa democracia jovem, caracterizada pela promiscuidade da relação entre agentes públicos e privados, pavimenta-se, então, o caminho perfeito para a judicialização da política.

          As duas últimas décadas redesenharam o perfil das principais agremiações políticas no Brasil de modo a operar uma falsa dualidade ideológica entre o PT e o PSDB, caracterizando uma espécie de bipartidarismo arbitrado por uma terceira força política encarnada no PMDB, que retiraria a sua força da sua lógica cartorial.

          De alguma maneira, a falsidade desse antagonismo, precisamente no momento atual, se assemelha com a também falsa dicotomia entre conservadores e liberais nos tempos imemoriais do império.

          Do ponto de vista sociológico, se levássemos a sério essa dualidade, seria forçoso observar que ela estaria condenada ao fracasso, pois, um país com formação e demandas tão complexas jamais caberia nessa agenda esquemática e propositalmente polarizada.

          Ao chegar ao poder no inicio dos anos 2000, O PT já havia abandonado, por meio de sua direção majoritária, boa parte da semiose classista que esteve na base da sua formação e tinha incorporado na esfera discursiva o programa social democrata que ironicamente está nos alicerces de formação do PSDB.

          O movimento pendular que levou o PT a incorporar o discurso socialdemocrata o levou rapidamente a assimilar uma agenda de direita na qual a interlocução com o trabalhador foi substituída pela interlocução com o povo e o discurso da luta de classes foi substituído pelo discurso da conciliação que resgatava a utopia de humanização do capital.

          Em meio a revezes eleitorais e assistindo a corrosão do diálogo com a sua base social original, o PSDB se viu empurrado para a extrema direita e aceitou ser instrumentalizado por essas forças conservadoras.

          A despeito dos sentimentos e paixões que se tornam mais agudos em determinados momentos, há muito que o PSDB e o PT pauperizaram o vocabulário político e unificaram grande parte da sua agenda econômica; o discurso pauperizado precarizou ainda mais a inteligibilidade da sociedade sobre os nossos reais e dramáticos problemas.

          A inteligência nacional que se origina desse debate distorcido é essa que hoje vaga a procura de um santo para encaminhar a resolução dos problemas nacionais. E é ai que os problemas começam.

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