O Pensamento Civil e as Teorias Sociais

22/01/2016 11:42 - Diálogos e Debate
Por redação

        Gilberto Freire e Sérgio Buarque de Hollanda foram, talvez, ao lado de Florestan Fernandes, os três grandes responsáveis pela gênese de um pensamento sociológico genuinamente brasileiro. Mas, olhando em retrospectiva, a exceção de Florestan, os dois primeiros, elaboraram impressões sobre o Brasil que parecem, à luz dos nossos tempos, carecer de base científica. 
        Freire romantizou a escravidão e construiu um projeto sociológico que pretendia negar o racismo a partir de uma visão segundo a qual, o negro foi incorporado a sociedade brasileira através de um processo permeado por docilidade e afeto.
Por essa perspectiva, os entremeios entre a casa grande e a senzala seriam separados por aspectos culturais, negando assim, um racismo calcado em elementos científicos, que atribuía ao negro a sua condição “natural” de sujeito inferior.
Buarque de Hollanda, a sua maneira, se debruçou por sobre o mito, anteriormente criado por Freire, para elaborar a sua teoria do “homem cordial”, segundo a qual, o brasileiro seria uma espécie de ser que traria na sua natureza uma aversão as instituições, naturalizava-se a partir daí, a imagem do brasileiro como um sujeito afetuoso, indolente e suscetível à corrupção.
        Essa sociedade civil, amorfa, iletrada e gelatinosa, seria facilmente manipulada pelos donos do poder que na visão de Raimundo Faoro, utilizaria um Estado de bases patrimonialistas na qual a fronteira entre o publico e o privado desapareceria em beneficio do enriquecimento pessoal e da manipulação de amplos extratos sociais.
        A esfera pública desapareceria dando lugar a uma sociedade privatizada e um povo sem espirito público. Portanto, a sociologia clássica brasileira que precedeu Florestan foi construída sob o tripé mitológico da negação do racismo/homem cordial/estado patrimonialista.
        As evidências desse tripé não lhe conferem um caráter cientifico e tanto Freire quanto Faoro e Buarque criaram uma inteligência coletiva assimilada majoritariamente pela sociedade brasileira, e, nesse contexto, o brasileiro absorveu sobre si mesmo, a imagem de sujeito dócil, avesso a rupturas, passivo diante de um estado corrupto e que historicamente procurou ignorar o ódio.
        Mas, uma rápida pesquisa histórica revela que o ódio sempre esteve entre nós. Num momento em que celebramos os 150 anos de Euclides da Cunha, é oportuno lembrar que naquela ocasião, dois países se enfrentaram: o Brasil do litoral – dos brancos racistas – no fundo odiava o Brasil dos sertões – de negros, bárbaros e fanáticos. 
Muito mais do que o estado brasileiro a destruição de Canudos atendia a uma demanda das nossas elites.
E nesse jogo de ódios mútuos, aquela chama de esperança acabou sendo violentamente apagada por uma república nova e irresponsável, tão irresponsável quanto até hoje se mantém.

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