O maior perigo que pode nos acometer é a sensação de que os moradores de rua são meros componentes da paisagem urbana.
Apenas uma sociedade completamente anestesiada pode olhar para essas pessoas e não sentir absolutamente nada, nem mesmo indignação.
Não se trata de uma situação de pobreza extrema: o vício em drogas ou o alcoolismo estão entre os principais fatores que empurram as pessoas para uma vida nas ruas.
Esse dado evidencia um segundo desafio, o de recuperar pessoas que chegaram a perder até sua autonomia para substâncias como o crack; torna-se evidente a necessidade de integrar as políticas voltadas aos moradores de rua com as iniciativas que buscam a desintoxicação e a ressocialização do dependente.
Mas, antes mesmo de um programa de recuperação, a primeira necessidade que um morador de rua precisa é bem mais simples: Atenção.
Ficou célebre a experiência do psicólogo Fernando Braga da Costa, que para sua dissertação de mestrado sobre a “invisibilidade social” trabalhou como gari, limpando as ruas do campus da Universidade de São Paulo. Seu relato, que acabou dando origens ao livro Homens Invisíveis, mostra como, ao vestir o uniforme, ele foi transformado em um ninguém, ignorado por qualquer um que não fosse gari como ele, e como o fato de desaparecer aos olhos da sociedade pode machucar um ser humano.
A indiferença é uma reclamação que ouvimos dos moradores de rua de Maceió.
E ela é o maior perigo que pode nos acometer: a sensação de que essas pessoas são mero componente da paisagem urbana. Apenas uma sociedade completamente anestesiada pode olhar para um morador de rua e não sentir absolutamente nada, nem mesmo indignação.
O drama dos moradores de rua é grande demais para que deixemos sua solução apenas nas mãos do poder público. A assistência social nasceu e cresceu como iniciativa independente do Estado, e a história registra exemplos de entidades, como ordens religiosas, que criaram incríveis redes de assistência que incluíam saúde, educação e o cuidado especial com os desamparados.
No entanto, à medida que o poder público foi assumindo essa tarefa, a sociedade civil também foi se descuidando dela, com louváveis exceções. Associações de bairro, igrejas, clubes e demais instituições poderiam muito bem mobilizar seus membros para aliviar o sofrimento pelo menos daqueles que estão mais próximos.
E não apenas com atitudes que oferecem remédio para uma necessidade urgente; o sopão, o abrigo para uma noite é necessário, mas ainda mais importante é a busca de meios que permitam a essas pessoas finalmente deixar as ruas e recuperar sua dignidade.