A Justiça Terapêutica, nova proposta de alternativa penal, nascida nos Estados Unidos da América e já adotada em alguns Estados brasileiros, consiste em um conjunto de medidas voltadas para que o agente que comete crime ou infração penal, envolvido com a utilização de drogas, receba tratamento, ou outro tipo de terapia, de acordo com o seu grau de utilização, quando verificados os requisitos legais; buscando-se, desta forma, evitar a aplicação de pena privativa de liberdade e possibilitar a melhor reeducação e reintegração deste infrator.
Considerados os objetivos e outros elementos conceituais indispensáveis, a Justiça Terapêutica Restaurativa pode ser conceituada como um programa, que em conjunto com o sistema judicial e equipe multidisciplinar, aplica uma série de medidas voltadas para a possibilidade de se permitir que infratores usuários, em uso, abuso indevido, ou dependente químicos tenham a faculdade, salvo exceções, de entrar e permanecer em tratamento médico ou receber outro tipo de medida terapêutica, em substituição ao andamento de processo criminal ou à aplicação de pena privativa de liberdade, quando da prática de delito de menor potencial ofensivo, relacionada ao consumo de drogas; nos casos em que a lei possibilitar.
É, portanto, a Justiça Terapêutica Restaurativa a melhor forma de se garantir efetivamente a reintegração do usuário de drogas, que em razão delas tenha cometido crime; pois, ao possibilitar que ele trate o problema que o leva a delinqüir, a pena estará funcionando como um remédio para a criminalidade e não apenas como meio de punição. Ademais, além de ser uma forma de efetivação penal, a Justiça Terapêutica Restaurativa é um instituto que diminui a recidiva no uso de entorpecentes, promove a pacificação social e revela-se como alternativa à pena privativa de liberdade.
A denominação "Justiça Terapêutica Restaurativa", dada ao programa, é a mais acertada, devido à sua pertinência temática e por envolver especificidades da matéria abrangida, embora outras tenham sido propostas, como o termo "Justiça Cidadã", porém este último é muito genérico, não tendo ligação etimológica com as finalidades do programa.
É importante que se diga que a Justiça Terapêutica Restaurativa tem sustentação nos direitos fundamentais, principalmente nos direitos à vida e à saúde e no princípio da dignidade da pessoa humana, haja vista que as drogas são lesivas ao bem-estar individual, à saúde pública e a sadia qualidade de vida; ou seja, os entorpecentes afetam drasticamente a saúde do indivíduo que passa a ter uma vida degradante e sem qualquer dignidade, como se fosse um escravo. A lesividade dos tóxicos à saúde e ao exercício digno da vida, considerando-se a especial proteção que o ordenamento jurídico confere a tais bens, constitui o fundamento jurídico da instituição do programa.
A justificativa social da Justiça Terapêutica, por sua vez, se encontra na problemática das drogas, principalmente na sua influência à criminalidade e, ainda, nas grandes dificuldades apresentadas pelo sistema punitivo, pois, como já dito, o binômio existente entre as drogas e a criminalidade, bem como a dificuldade que se tem em desfazê-lo constituem um grave problema social que pede soluções urgentes.
Assim, pode-se dizer que a implantação do programa tem justificativa na necessidade de que soluções sejam propostas, no sentido de se amenizar este mal que assola a sociedade.
Quanto à viabilidade jurídica, esta se concretiza nas hipóteses legais que possibilitam a aplicação do programa, seja, esta, conjugada a outras medidas penais alternativas (suspensão condicional do processo, transação penal, suspensão da pena, limitação de fim de semana), ou autônomas (medidas educativas do Estatuto da Criança e do Adolescente); e Lei nº 11.343/2006, sempre se observando os procedimentos e os requisitos estabelecidos pela lei.
É importante considerar que cada uma destas hipóteses legais possui as suas especificidades, sendo que algumas delas permitem a aplicação facultativa das medidas terapêuticas, enquanto outras possibilitam, apenas, a imposição coercitiva do tratamento, funcionando este como forma de sanção.
Ademais, a aplicação da Justiça Terapêutica Restaurativa, para que seja imediata, além desta integração sistemática, através do uso de dispositivos legais já existentes, pressupõe uma mudança de paradigma dos aplicadores do Direito e a conseqüente realização de atos estratégicos voltados para o estabelecimento efetivo do programa, como o debate acerca do assunto e a definição de diretrizes e padrões a serem seguidos.
Ainda, as vantagens do programa são inúmeras, quando comparadas com as demais penas que compõem o ordenamento jurídico, principalmente porque é uma forma de se dar maior efetividade à incidência penal, garantindo uma melhor reeducação e reintegração social do infrator-usuário, além de apresentar um custo financeiro reduzido para o Estado; é, deste modo, instrumento penal de concretização da finalidade de reestruturação social pós-crime, verdadeiro remédio de tratamento da atividade delitiva.
Embora algumas críticas tentem atingir o programa e posicionamentos ideológicos estimulem o debate acerca do assunto, principalmente no campo da Psicologia, a Justiça Terapêutica é uma forma de efetivação da individualização da pena e, também, de aproximação do Poder Judiciário dos problemas sociais, sendo que a pacificação só se perfaz quando se elimina a raiz da discórdia.
Por fim, há que se dizer que a Justiça Terapêutica tende a ser um verdadeiro remédio penal na luta pela quebra do binômio existente entre as drogas e a criminalidade, pois age diretamente na raiz do problema, destruindo o vício do infrator-usuário que, conseqüentemente, se afasta da prática criminosa. As críticas devem ser ponderadas com as vantagens e os futuros estudos e debates demonstrarão qual a melhor forma de aplicação deste novo instituto penal, que é a Justiça Terapêutica.
RONNIE REYNER TEIXEIRA MOTA
Presidente da Comissão de Justiça Terapêutica sobre Drogas da OAB/AL
Vice-Presidente do Conselho Estadual de Políticas Sobre Drogas de Alagoas - CONED
Membro do Conselho Nacional de Políticas Sobre Drogas- CONAD