Joaquim Miranda
Cuore – Centro de Orientação e Tratamento de Dependentes Químicos e Alcoólicos
O uso de armas de choque para a abordagem de dependentes químicos vem causando polêmicas em vários estados do país. De um lado, a Secretaria Nacional de Segurança Pública justifica o investimento em “sprays” de pimenta e armas de choque elétrico com o aumento da criminalidade nas grandes cidades causado por usuários químicos,principalmente de crack.
Do outro lado, a psiquiatria, órgãos de direitos humanos, entidades e especialistas no assunto consideram a iniciativa, um ato covarde e pode ser encarado, na área médica, como abuso de poder com uso indevido de violência em pessoas acometidas de transtornos mentais e comportamentais.
Embora o Ministério da Justiça diga que as armas só serão usadas em situações de perigo que exijam intervenção da polícia, seu uso, em qualquer ocasião, torna-se completamente equivocado. Isso acontece porque o crack, droga derivada da cocaína, causa aceleração dos batimentos cardíacos.
Estudos mostram que usuários de crack e cocaína adquirem danos cardiovasculares e têm 24 vezes mais chances de ter enfarte em relação à população em geral. O uso de uma arma de choque em um dependente químico em crise, principalmente no caso de usuários de crack, com intuito de contê-lo e preservar sua integridade física, pode se tornar letal. O choque pode provocar uma provável parada cardiorrespiratória, o que levaria o usuário a óbito sem o auxílio médico necessário.
A dependência química já é uma violência muito grande que o usuário faz consigo mesmo, portanto, usar uma arma de choque só irá agredi-lo mais, ao invés de incentivar sua recuperação. Infelizmente, optaram por uma medida imediatista, conduzida pela falta de informação e de planejamento, que irá acarretar em maiores danos a sociedade.
A abordagem do dependente necessita de um plano de ação através da intervenção de profissionais treinados e capacitados. Eles saberão usar estratégias de aproximação e a abordagem necessária feita de acordo com as características de cada usuário. Saberão também usar uma abordagem mais rígida, caso seja necessário, porém menos agressiva e sem recorrer ao uso de armas de choque elétrico ou “sprays” de pimenta. Assim, é possível realizar uma intervenção orientando e influenciando o dependente químico a buscar o tratamento.
Outro fator importante e quase nunca citado é o que fazer com o dependente após a abordagem. A participação da família é muito importante para alcançar o objetivo em qualquer tipo de tratamento, no sentido de promover uma maior motivação e de fazê-lo compreender que a dependência química não é um problema que afeta apenas a sua vida.
Entretanto, no caso dos usuários de crack, muitos abandonaram seus lares ou foram abandonados pelas pessoas que faziam parte de sua convivência afetiva. Como a dependência enfraquece o usuário, ele precisa de outras pessoas que o façam sentir que ele pode sim se recuperar, pessoas que não desistam dele, sem serem codependentes, auxiliando em seu amadurecimento emocional.
Por isso, é fundamental que, além de uma abordagem onde eles não se sintam agredidos, eles sejam levados a locais adequados onde possam receber o apoio necessário para a recuperação, com pessoas capacitadas para lidar com todas as fases do tratamento, incluindo a abstinência.
Precisamos lembrar que é inerente ao ser humano tornar-se inacessível a qualquer tipo de abordagem, nos cercando de defesas, sempre que nos sentimos acuados ou agredidos.
Joaquim Miranda
Cuore – Centro de Orientação e Tratamento de Dependentes Químicos e Alcoólicos
Website: www.cuorecuidados.com.br
Facebook: www.facebook.com/Cuorecuidados