Começo a rabiscar o que você lê agora às duas horas e 40 minutos desta quarta-feira. O ministro Luiz Fux dá seu voto no julgamento de Bolsonaro e mais sete comparsas na trama golpista. Se o voto do relator Alexandre de Moraes durou cinco horas, Fux vai bater o recorde. Ele começou a falar às nove da manhã, parou para o almoço e retomou a leitura no começo da tarde. Bolsonaristas Brasil afora estão pulando carnaval.

Fux gastou quase toda a manhã com uma espécie de tratado sobre as chamadas preliminares que foram apresentadas pela defesa dos réus. Antes de entrar no mérito da ação penal, ele deixou claro de que lado está. Resumindo, o magistrado defendeu a nulidade completa do julgamento. Foi tão enfático que até a turma de Bolsonaro demonstra surpresa. As teses do juiz abraçam as fantasias da turma denunciada.

Maior que a surpresa, somente a comemoração dos advogados. Fux está sendo chamado de herói pelos golpistas, recebe declarações de amor pelas redes sociais e é visto como a chance para mudar tudo no curso dos acontecimentos. Não é para tanto.

Ele dá um voto enfático, mas isso não significa que esteja sendo técnico e fiel aos episódios levados ao processo. Aliás, na maior parte do voto, ele não trisca no que a Procuradoria-Geral da República apresenta como provas da organização criminosa.

A coisa ficou mais estranha na segunda parte da leitura, que ocorre enquanto batuco estas linhas. O ministro decidiu dar uma aula sobre as origens e transformações da democracia ao longo do século 20 até os dias atuais. A descabida peroração levanta suspeitas de que o objetivo é bagunçar o julgamento. Perigoso aceno aos criminosos.

As ideias defendidas pelo ministro não alteram a gravidade do que houve e não devem afetar os votos dos colegas que ainda vão falar. Ainda vão se manifestar a ministra Carmen Lúcia e o presidente da Primeira Turma, Cristiano Zanin. Fux será o único a falar nesta quarta. O julgamento será retomado na manhã de quinta-feira. Vai até sexta.

Celebremos a divergência. Como se sabe, o debate entre pontos de vista diferentes enriquece a busca de avanços no regime democrático. Luiz Fux disse coisas pertinentes, com lógica e plausibilidade razoáveis. Mas o homem passou do ponto diversas vezes.

O mais complicado no juridiquês fuxiano é subestimar a gravidade do que se passou no Brasil sob a gangue chefiada por Bolsonaro. O juiz que minimiza fatos incontroversos sabota o sagrado Estado de Direito e o devido processo legal. É a negação da Justiça.

E finalmente temos a repercussão política do voto-palestra do ministro xodó dos golpistas. Como disse na abertura, advogados e seguidores de Bolsonaro fazem festa. A ver o que isso trará concretamente ao ambiente das disputas de poder e do jogo eleitoral.

Segue o voto do Cabeleira. Retorno com mais especulações quando ele terminar.