Sim, hoje, dois de setembro de 2025, é um dia histórico. Às nove horas da manhã começa o julgamento de Jair Bolsonaro, o ex-presidente da República denunciado por tramar uma virada de mesa, também conhecida como golpe de Estado. Ao lado de Jair, serão julgados outros sete integrantes no chamado núcleo principal nos planos que pretendiam impedir a posse do presidente eleito. A robustez das provas é um consenso.

Bolsonaro no banco dos réus atesta que o Brasil encerra uma tradição de impunidade para golpistas. Ao contrário do que fizeram a Argentina e o Chile, concedemos anistia a todos que cometeram crimes hediondos em nome de um projeto de poder. Ditadores e torturadores ficaram livres depois de tudo o que aprontaram ao longo de duas décadas – levando-se em conta os marcos do regime de terror inaugurado em 1964.

Militares das Forças Armadas e ex-ministros – como Walter Braga Netto, Augusto Heleno e Almir Garnier – tiveram papel de destaque na arquitetura criminosa. Para o ex-presidente, se condenado, a sentença pode bater em 43 anos de cadeia. A essa altura, seus advogados já trabalham pela redução de danos, como escapar do regime fechado.

Na imprensa internacional, é praticamente unânime o reconhecimento de que o Brasil dá um passo de gigante na defesa do regime democrático. Mais que isso, o país passa uma mensagem de maturidade e firmeza de suas instituições, num exemplo para o mundo. Fizemos o que os Estados Unidos não foram capazes de fazer diante de Donald Trump.

Aliás, especula-se que o presidente americano estaria disposto a se manifestar em tempo real durante o julgamento de Bolsonaro. A cada má notícia para o ex-presidente, Trump anunciaria mais uma sanção ao Brasil. Não acredito que o chefe da Casa Branca dedique tamanha atenção assim ao “amigo” brasileiro. Bolsonaristas rezam para isso.

Não importa. Por tudo o que houve nos últimos anos, foram incontáveis os ataques e ameaças ao STF e a seus ministros. Relator da ação penal, Alexandre de Moraes foi o alvo número um de Bolsonaro e aliados. Até plano de assassinatos estava no pacote. A despeito de tudo isso, o tribunal não recuou jamais de suas obrigações legais.

No topo, Bolsonaro deve ter sonhado que de lá nunca mais sairia. Ao que parece, acreditou que estar no comando do país lhe dava um poder sem limites, acima de todas as regras. A repetida frase do capitão segundo a qual “sempre jogou dentro das quatro linhas” é o slogan de um farsante. Sua praia sempre foi a da ilegalidade, da bandalheira.

As repercussões políticas do julgamento devem escalar alguns degraus após a eventual condenação de Bolsonaro. Nada mais natural. Mas esse é um aspecto que não deve interferir na posição dos ministros, nem antes nem depois. Exatamente como tem sido até agora. O desfecho do julgamento vira uma página infame na realidade brasileira.

O país resistiu à truculência, à boçalidade e aos arroubos de um tiranete que, mais de uma vez, reverenciou a prática de tortura. É alguém que trata direitos humanos como “esterco da vagabundagem”. O conjunto da obra é abominável. Que esse lixo pague por seus crimes. Neste dia histórico, não há dúvida: nossa democracia fica mais forte.