“Ore pelo Brasil”. É o que está escrito na camiseta de uma senhora que, neste domingo, participou de manifestação em apoio a Bolsonaro. Na foto acima, a mulher está ao lado de um senhor que parece em contato direto com o além. Ele está ajoelhado perto de outra mulher que também se ajoelha. Na camiseta do homem, a mensagem não faz referência ao plano do sobrenatural. A causa é toda política: “Fora Moraes”.
O bolsonarismo enfiou no mesmo saco o jogo político e a religião. Não tem como dar certo. Quando isso ocorre, é inevitável que a razão seja envenenada pelo fanatismo. Essa aliança explosiva sempre existiu, mas a candidatura de Jair Messias em 2018 foi um momento de inflexão. De lá para cá, tudo piora a cada oração, a cada aleluia.
Os manifestantes da fotografia saíram pelas ruas de Brasília e foram até o condomínio onde Bolsonaro cumpre prisão domiciliar. Segundo os participantes, o ex-presidente “é vítima do sistema”, mas “a Justiça de Deus é mais forte”. Na guerra, Alexandre de Moraes é o capeta, agindo diretamente do inferno, no caso o Supremo Tribunal Federal.
A parada é antiga, como disse. A expressão bancada evangélica está aí há décadas. Nos últimos anos, porém, o fundamentalismo avançou a níveis inéditos no Congresso Nacional. Há dois ou três parlamentares evangélicos em partidos de esquerda, mas a maioria engrossa as fileiras da extrema direita. Aqui, Estado laico é heresia.
Os evangélicos, assim como os católicos, não formam um bloco monolítico, alertam estudiosos do tema. O preconceito e o menosprezo pelos fiéis não ajudam na compreensão do fenômeno. Quem sai no lucro com isso são exatamente os pastores de carnaval e os padres de quadrilha junina. Nem precisamos falar de Silas Malafaia.
Agora, longe dos debates sobre tolerância religiosa e convivência pacífica, a politicalha usa e abusa da crença individual para turbinar o obscurantismo ideológico. Esse é o caso do bolsonarismo. A hipocrisia é a marca mais visível na ação de políticos que prospectam votos em nome de Deus. Qualquer aberração se justifica pela Bíblia.
O histórico de Bolsonaro, Sóstenes Cavalcante, Damares Alves e Malafaia, por exemplo, não combina com o discurso do cristianismo. Mas o fanatismo é cego, com o perdão do lugar-comum. Predomina, segundo dados objetivos da realidade, o comportamento de manada, com fidelidade incondicional a aventureiros do quilate de Jair Messias.
A demagogia política sequestrou a fé de milhões de pessoas Brasil afora. A foto domingueira de Brasília, com um grupelho que parece abduzido, reafirma o estado das coisas. Como tudo muda, que um dia os súditos despertem da vertigem ilusionista.