Desde o ano de 2020, em Alagoas, a atividade econômica que envolve pedreiras foi a que mais concentrou vítimas resgatadas de trabalho análogo à escravidão, além de representar uma ameaça ao meio ambiente. A Fiscalização Preventiva Integrada (FPI) do Rio São Francisco levantou informações sobre a cadeia produtiva da extração mineral no município de Ouro Branco, nesta segunda-feira (18).
A iniciativa dialoga com o projeto “Reação em Cadeia: atuação do Ministério Público do Trabalho em cadeias produtivas”, tocado em Alagoas pela procuradora do Trabalho Marcela Dória. Visa identificar e responsabilizar os principais beneficiados pela exploração do trabalho em pedreiras, que muitas vezes envolve empresas de grande porte e até mesmo o poder público, como compradores das pedras obtidas em condições de trabalho degradantes.
“Nosso objetivo é promover o trabalho decente nas pedreiras. Esperamos reduzir o número de resgates de trabalho escravo na atividade e fazer com que os empregadores se sensibilizem a obedecer a legislação trabalhista nesse setor, evitando que mais trabalhadores tenham a sua dignidade violada através da exploração do trabalho escravo”, disse a procuradora, que integra a Coordenadoria Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo e Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas (Conaete) do MPT.
A equipe Resíduos Sólidos, Extração Mineral e Segurança de Barragens da FPI visitou uma pedreira localizada dentro da Área de Proteção Ambiental (APA) da Serra da Caiçara, em Ouro Branco. No local foram encontrados indícios de que trabalhadores tinham passado pelo local pouco antes da fiscalização chegar. Restos de fogueira recente e uma garrafa térmica com água fria. Além disso, os técnicos encontraram ferramentas de extração das pedras, ambientes de descanso improvisados e estrutura elétrica para detonação de explosivos.
“Nós encontramos uma situação de exploração das pedras, como paralelepípedos e meios-fios, praticada de forma bem rudimentar. Quem trabalha no local utiliza utensílios bem rústicos, de forma manual e precária, o que causa muitos acidentes de trabalho, alguns deles fatais. A nossa atuação nas pedreiras também tem por objetivo evitar que os trabalhadores se machuquem”, informa Rafael Vanderley, coordenador da equipe Resíduos Sólidos, Extração Mineral e Segurança de Barragens da FPI.
O MPT abrirá um procedimento promocional para facilitar a adequação da atividade econômica à legislação trabalhista vigente. A procuradora Marcela Dória deve envolver proprietários de pedreiras, contratantes de trabalhadores, compradores dos produtos decorrentes da extração mineral e poder público.
Desde o ano de 2020, 97 trabalhadores em situação análoga à escravidão foram resgatados em Alagoas. Destes, 72 trabalhavam na extração de pedra, argila e areia, conforme dados do Observatório da Erradicação do Trabalho Escravo e do Tráfico de Pessoas, coordenado pelo MPT e a Organização Internacional do Trabalho.
Danos ao meio ambiente
A agente do Instituto do Meio Ambiente de Alagoas, Anne Carolyne enfatiza que a extração ilegal de pedras em unidades de conservação causa sérios danos ambientais, culturais e sociais.
“Essa prática destrói paisagens únicas, de valor científico e histórico, além de comprometer a biodiversidade, afetar habitats frágeis e degradar o solo. Compromete também a ciência e a educação, uma vez que destrói registros geológicos e culturais importantes. Na APA da Serra da Caiçara, o impacto é ainda mais grave. A região abriga sítios arqueológicos e paleontológicos valiosos, que são diretamente ameaçados por essas atividades”, explica.
O proprietário do imóvel foi autuado e recebeu um Termo Circunstanciado de Ocorrência por não possuir licença ambiental para realização da extração mineral. A falta de autorização acarreta danos ambientais dentro de uma APA.
A equipe de Resíduos Sólidos, Extração Mineral e Segurança de Barragens é composta por Batalhão de Polícia Ambiental (BPA), Conselho Regional de Engenharia e Agronomia de Alagoas (Crea-AL), Conselho Regional dos Técnicos Industriais da 3a Região (CRT-3), Instituto do Meio Ambiente de Alagoas (IMA/AL) e Secretaria de Estado do Meio Ambiente e dos Recursos Hídricos (Semarh).
*Com Ascom FPI