Na eleição do ano passado, Maceió foi palco de uma marmota inédita na política brasileira: um senador renunciou ao mandato para disputar o cargo de vice-prefeito. A decisão de Rodrigo Cunha não tem precedente no complexo modelo partidário do país. Por que alguém abandona o Senado, no topo da República, por uma vaga no último escalão? Não há comparação entre os dois postos – com todo o respeito aos vices.

A única explicação seria a existência de um acordo para uma conquista muito maior, logo adiante. O acordo existe, embora não se conheçam os detalhes – o que é um padrão nesse tipo de negócio. O acerto de gaveta, jamais admitido por seus signatários, prevê JHC candidato a governador e Cunha assumindo a prefeitura em definitivo.

O prefeito de Maceió pode também ser candidato a senador – o que não muda o destino do vice. Pelo prazo da lei, JHC tem de renunciar até abril de 2026. Cunha herda um ano e oito meses de mandato e disputa a reeleição em 2028. No meio, ainda tem a senadora Eudócia Caldas, que, parece, se adaptou bem a Brasília. Assim a banda vai tocando.

E se João Henrique Caldas quebrar o pacto supostamente celebrado entre eles? Nem Senado nem governo, cumpre o mandato até dezembro de 2028. Não tenho certeza, mas essa talvez seja a hipótese bem menos cogitada na imprensa alagoana. Que eu tenha visto, quase nada. Talvez porque seja mesmo um desfecho menos provável. 

Diretamente vinculados a esse arranjo estão Arthur Lira, Renan Calheiros (pai e filho), o governador Paulo Dantas, a cúpula da Assembleia, prefeitos, partidos, o STJ e até o presidente Lula. Carambolas! Vejam aí quantas fontes de inquietação.

Mas o que chama atenção é o papel do vice Rodrigo Cunha. Se o prefeito de fato não sair, suponho que o ex-senador ficará, quando menos, num incômodo constrangedor. Não deixa de ser compatível com o ato de renúncia ao Senado para ser vice.

Como vice-prefeito, Cunha cumpre maratona de compromissos, mostra serviço e garante visibilidade. Num registro recente de sua agenda, ele aparece na inauguração de um supermercado. Não foi para isso, suponho, que ele abandonou o Senado. Ou foi?

No mais, decisões secretas, nada decidido e tudo pode acontecer.