No Jornal Nacional, para tratar da bagaceira na Venezuela, depois da eleição aparentemente fraudada de Maduro, os repórteres falam direto de Brasília, de Londres, de Nova York e de Washington. Menos de Caracas ou de qualquer outra cidade venezuelana. Por alguma razão desconhecida, a Globo não enviou nenhum jornalista para ver de perto o terremoto político que sacode o país vizinho. Uma postura inexplicável diante da gravidade dos fatos. E bem aqui, ao nosso lado.
Seria por preocupação com a segurança dos profissionais? Não é um argumento convincente. Uma concorrente com estrutura muito menor, a Band, está com um nome próprio cuidando de enviar notícias ao Brasil sobre os abalos na terra do chavismo. O experiente Yan Boechat, sem o aparato da emissora carioca, é repórter e cinegrafista ao mesmo tempo. Um sufoco. Mesmo assim, nada como estar no olho do furacão.
Para o outro lado do planeta, em outro país em tumulto, a atenção da Globo é maior. Desde que explodiu o conflito entre Israel e o Hamas, com os bombardeios sobre Gaza, a maior rede do Brasil conta com a repórter Paola De Orte. Ela é correspondente em Tel Aviv, mas também circula por outras regiões naquela parte do mundo. São situações distintas, é claro, mas não deixa de ser um parâmetro para analisar a imprensa.
Voltando à Venezuela, a CNN Brasil também está com uma correspondente especial na cobertura da crise atual. É a repórter Luciana Taddeo, que tem apresentado informações exclusivas – como mostrar algumas das tais atas de votação. Algo assim só é possível com o jornalista no local dos eventos. É para isso que existe a figura do “enviado especial” para lugares que, de repente, viram cenário de algo fora do comum.
Uma das coisas mais insuportáveis é ver “correspondentes” da Globo falando do Equador ou de Cuba a partir do escritório da emissora em Londres. Os caras mais parecem modelos de passarela fashion week, empacotados naquilo que é um tributo à afetação – o cachecol multicolorido. Nessas ocasiões, o repórter lê um texto que é claramente um cozido das agências internacionais, sem qualquer vestígio de originalidade.
Ou seja, qualquer pessoa pode produzir aquilo, em qualquer lugar do mundo, inclusive no Brasil. É o falso correspondente. Grande parte desse descalabro é a renitente mentalidade colonizada – um velho tema repaginado na ordem do dia. A Globo tem dezenas de jornalistas nos Estados Unidos e na Europa, e praticamente nenhum na América do Sul. Nem quando um país entra em convulsão, o disparate arrefece.
Resultado: perde o jornalismo, perdemos todos, submetidos a uma produção sem qualquer profundidade, resumida a um roteiro de enredos pré-moldados para o consumo de massa. O caso Venezuela expõe o menosprezo pela grande reportagem exclusiva, com a assinatura de quem testemunha o surgimento da notícia na origem, no calor da hora. A cobertura da Globo da crise venezuelana já é um vexame histórico.