Jair Bolsonaro foi à livraria. Se não houvesse imagens para provar, poderia ser mais uma fake news armada no gabinete do ódio por Carlos e Eduardo Bolsonaro. Ninguém deu muita bola para o acontecimento, afora um registro aqui e outro ali na imprensa. Afinal, trata-se de um ex-presidente da República. Mas calma lá. É preciso explicar o motivo dessa visita tão improvável quanto a chance de Bolsonaro ler um livro. 

O único volume que ele diz ter lido na vida é a biografia de Brilhante Ustra, um dos piores vagabundos morais na categoria de torturadores do regime militar. O paraquedismo de Bolsonaro foi numa livraria de Brasília, na última quarta-feira, durante o lançamento de uma obra assinada pelo alagoano Aldo Rebelo. O ex-ministro nos governos Lula e Dilma Rousseff hoje é secretário de alguma coisa na prefeitura de São Paulo. 

Já escrevi aqui sobre a conduta de Rebelo nos últimos anos. Depois de décadas filiado ao PC do B, considerado uma referência na esquerda, ele mudou de lado. Até aí tudo bem. O problema com o filho de Viçosa é que ele escolheu o lado da escória. Abraçou as teses do negacionismo climático e virou garoto-propaganda do agronegócio. Sua turma debate projetos e ideias com a civilidade de jagunços e a sutileza de motosserras.

O sonho do secretário paulistano é a vaga de vice na chapa do prefeito Ricardo Nunes – uma impossibilidade incontornável dada a configuração do arranjo com o bolsonarismo. Mas isso é lá com a alta política da metrópole. Voltemos à literatura, por assim dizer. Rebelo lançou Amazônia, A Maldição das Tordesilhas: 500 anos de cobiça internacional. A julgar tudo o que tem dito sobre o tema, dá para imaginar a linha teórica.  

O ex-presidente não ficou mais que cinco minutos e foi embora sem dar entrevista. Antes, recebeu um caloroso abraço do amigo e consta que pagou pelo exemplar que levou para casa. Um militar que também apareceu tem tudo a ver com o que se passou no país sob o banditismo de golpistas. Lá estava o general Villas Bôas, aquele que ameaçou o STF, em abril de 2018, às vésperas do julgamento sobre a prisão de Lula.

As duas presenças ilustres mostram o nível no cercadinho do anfitrião. Num passado distante, defensor da democracia. No ocaso da trajetória política, aliado de canalhas que tudo fizeram para sabotar as regras do jogo, impedir as eleições e impor um governo pela força. Perderam. Mas continuam a conspirar em tempo integral. Nem que o livro de Aldo Rebelo fosse uma obra-prima da literatura apagaria a desonra de suas escolhas.