Na última sexta-feira, Willian Bonner fez uma pergunta difícil ao petista Paulo Pimenta, ministro da Secretaria de Comunicação Social do governo Lula. Ao vivo, no Jornal Nacional, a maior audiência de um telejornal do país, o apresentador questionou os critérios do governo para pedir investigação sobre notícias falsas a respeito da tragédia no Rio Grande do Sul. Pimenta está à frente dessas ações contra fake news.
O jornalista fez a pergunta a partir de uma premissa – a de que algumas manifestações nas redes são críticas ao governo, e não mentiras deliberadas sobre os trabalhos de enfrentamento à crise. Esculhambar governos, de fato, é direito sagrado de todos nós. Isso pode ser errado e até delinquência intelectual. Mas crime não é. O ministro respondeu, mas não respondeu, assim, preto no branco. Recorreu à retórica.
Bonner se deu por satisfeito, embora, na verdade, tenha ficado sem o esclarecimento devido. Por quê? Porque seria um debate interminável, o que não caberia ali numa entrevista rápida, no calor de uma cobertura sobre o drama que atinge milhares de pessoas. Além disso, caso esticasse a corda, a coisa poderia descambar para o constrangimento. A questão levantada, porém, está no centro desse debate universal.
Governo, Judiciário e Congresso estão aí a discutir a tal regulamentação das plataformas digitais. O evento no Sul abriu um capítulo inesperado sobre o assunto. Como já escrevi em texto anterior, há gente produzindo notícias falsas em escala industrial. É um jogo que interessa à extrema direita e a adversários do governo. Para estes, nada funciona na resposta oficial aos efeitos da chuva. O Estado falha em tudo.
Para sustentar essa versão da realidade, o caminho é a disseminação de coisas que só existem no mundo da fantasia. Mas como o governo deve agir diante do fenômeno? A pretensão de caçar – e eliminar – tudo o que é fake news está na prateleira do fracasso anunciado. Além de não fazer sentido, é inútil até como especulação de ordem quântica. Desencadear um tipo de guerra total nesse caso, sim, contempla o abismo.
O nome do abismo, claro, é censura. Nunca é demais lembrar que o direito à liberdade de expressão é cláusula pétrea na Constituição – e isso não pode ser visto como perfumaria. É uma conquista a ser defendida sem concessões. Ao crime tipificado, a lei e o processo legal. Esta régua está no Código Penal, e não em interpretações ampliadas sobre manifestações de pensamento – por mais desprezíveis que sejam.
Por isso, a pergunta de Willian Bonner para o ministro Paulo Pimenta ficou sem resposta.