É natural fazer um balanço do ano sempre que ele chega ao final. Confesso que de há muito já não me interesso por essa conta, que me parece despropositada e com chances bem razoáveis de estar incorreta. Acho que a depender do momento em que ela feita, o resultado será um que não há de se repetir com o passar do tempo.
Enfim, para mim, a vida é sempre um dia após o outro. Se perdi o hábito de fazer planos de longo prazo, e perdi mesmo, talvez se deva ao fato de que isso me soa inútil, por motivos que variam da precariedade da vida – biológica, que fique claro – ao fato de que o mais importante e necessário para mim é o que surge imediatamente à frente – alcançável, se factível.
Acordar a cada manhã, sempre bem cedinho, e seguir uma rotina que muito me agrada, já é um bom (re) começo do previsível cotidiano. Fazer o que é preciso, sim, mas nunca deixar de fazer o que me agrada e dá prazer. E como já confessei aqui, por diversas vezes, ainda que isso não desperte grande interesse em ninguém – e tem de ser assim mesmo -, que eu preciso de muito pouco para me sentir confortável em cada jornada: um bom colchão para dormir, temperatura agradável e breu absoluto no meu quarto, eis o meu jeito de atravessar as madrugadas, antes que o sol se anuncie.
Se chuva ou se sol, quando amanhece, seja como for, insistir na atividade física que me garanta a energia necessária para trabalhar, ler, ver meus filmes – um, quase sempre a cada noite -, e aprontar quando for momento de aprontar, com suas variedades e diferentes prazeres.
É tudo tão banal que leitores e leitoras, que se dão ao trabalho de ver essas tolices, haverão de se entediar. Mas fazer o quê, se demorei tanto a entender que o meu caminhar já não me cobra pressa nem sofreguidão?
Quanto aos aperreios do dia a dia, quando são inevitáveis, tento seguir a minha própria Navalha de Ockham: se o resultado for o mesmo, o mais simples é o correto. Mas já não me engano com soluções simplistas, procuro apenas não dificultar mais o que já é complicado – “Viver é muito perigoso”, sentença de Rosa.
É por isso que, para mim, a conta de chegada nunca vai passar na prova dos noves, porque ela usa produtos desiguais (cadeira e banana, por exemplo), em somas e subtrações que não haverão de apresentar resultados matemáticos reproduzíveis com exatidão se muda o calculista.
Convenhamos que a matemática, garantem os do ramo, sempre será a única ciência que se comprova. Já o objeto aqui tratado não prescinde de coisas tão abstratas e fluidas quanto a percepção que cada indivíduo tem dessa coisa tão frágil e fugaz a que chamamos de vida.
O mais próximo que projeto para o momento é o “enterro dos ossos”, que ocorrerá este ano numa segunda-feira, dia de recomeço para muita gente; de final de jornada prazerosa para outros tantos.
Ao fim e ao cabo, deduzo e confesso que levei tempo demais para aprender que tenho tão pouco a ensinar aos que vêm chegando – se é que há professores nessa sempre irreproduzível e misteriosa questão.
Mas não se impressione: essa é a minha maior vitória, ainda que lhes pareça, no máximo, um empate.
P.S.: Bom Natal para todos.

Ricardo Mota