Parecia um showmício das antigas. O cantor, no alto de um trio elétrico, desfiava um repertório perfeito para animar a multidão. Entre um hit e outro, o vocalista da banda enchia de elogios o político candidato que bancou a festa. Foi mais ou menos o que se passou no último sábado, na orla marítima de Maceió. Oficialmente, foi um evento da prefeitura da capital, dentro da programação de fim de ano. Qual a encrenca? A farra da aglomeração. A violação dos protocolos sanitários que o município jurou que cumpriria nessas ocasiões festivas.

Mas eu falei de showmício. E falei também de candidato. Reparem nessas palavras do cantor que liderava o arrastão da massa: “Obrigado, prefeito JHC, por fazer o povo maceioense mais feliz. Tive a honra de ter cantado a música da campanha do prefeito. E deu sorte... Pra mim. Porque ele é um homem de bem, um homem de Jesus. Parabéns prefeito JHC”! É ou não é discurso de campanha? 

A festa durou muitas horas, com o trio fazendo bem devagar o percurso Pajuçara-Ponta Verde. O gigantismo da coisa, claro, foi bater nas redes sociais. Muitas críticas à prefeitura por promover tal espetáculo quando se sabe, afinal de contas, que a pandemia de Covid-19 não acabou. O país ainda não sabe o que vai ocorrer com a última variante descoberta. Sob pressão, o município soltou nota, ainda no sábado, informando o encerramento do desfile.   

A nota não convence muito. Sobrou para a Fundação Municipal de Cultura, organizadora da programação de Natal e Ano Novo. A verdade é que está tudo errado no episódio. Afora a questão da pandemia, o que me parece mais grave é a apropriação político-partidária de um evento para a cidade. 

A louvação ao prefeito, nos berros do vocalista do trio, soa ofensivo. Porque aquilo ali é dinheiro público. Aquilo ali não é oportunidade para promoção pessoal. A atração artística não deve favor ao gestor contratante. Aliás, que coincidência é essa de cantar na campanha do então candidato JHC e ser contratado pela prefeitura para essa festa?

Nem preciso lembrar que JHC é virtual candidato a governador. Leiam aí na imprensa alagoana. Só se fala dessa possibilidade nas redações, escritórios e varandas gourmet. Talvez por isso o cantor do trio tenha se empolgado na saudação de homenagem ao prefeito. Confundiu o público e o privado; tratou como convescote o que seria do interesse coletivo.

Usar a máquina pública em benefício próprio é praticamente um dogma na política brasileira. Típico representante da “nova política”, o prefeito de Maceió deve ter notado que seu carnaval fora de época não combina com esse discurso de “renovação”.

O que ocorreu no sábado, com o Trio Elétrico de JHC, é troço muito antigo, velharia, reacionarismo. O requinte do atraso é – na Era da Nuvem – a bajulação no autofalante… Um populismo rastaquera do século 21. (Falo em tese. Nada pessoal). A gente não devia mais ter de passar por tamanho constrangimento.