Um país dividido pela máscara

22/12/2021 12:35 - Blog do Celio Gomes
Por redação
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Vacina é com a gente. Em novembro passado, uma pesquisa da ONU em parceria com o Banco Mundial revelou que, na América Latina, o Brasil é o país que menos rejeita o ato de se vacinar contra a Covid-19. Apenas 3% dos brasileiros disseram aos pesquisadores que não pretendiam se imunizar. Esse índice passa dos 8% no resto do continente. Reencontro esses números em reportagem da BBC Brasil.

E repare que o presidente da República atua ostensivamente contra a credibilidade das vacinas. O potencial de estrago das falas irresponsáveis do capitão é evidente, mas alguma coisa impede a adesão da maioria. Como Bolsonaro e seus súditos fazem muito barulho, pode até parecer que a sociedade vive uma guerra entre facções de mesmo tamanho, a favor e contra a vacinação.

Mas não é isso o que ocorre na prática, como provou a pesquisa da ONU. Institutos nacionais também já atestaram essa realidade. A constatação também nos informa do inusitado que é o eleitor de Bolsonaro adepto convicto da dose mágica no braço. Ou seja, o “mito” atira no pé ao desprezar a aprovação do imunizante.

Quanto à vacina, portanto, é falsa qualquer ideia de divisão e dilema. Isso existia lá na aurora do século XX, quando Oswaldo Cruz encarou o atavismo mental de uma época para, sob ataque dos obscurantistas, combater a peste, a varíola e a febre amarela. No romance Sonhos Tropicais, o grande Moacyr Scliar reconstitui magistralmente a loucura daqueles tempos.

Se estamos de acordo quanto ao acerto da vacinação, o mesmo não se pode afirmar sobre o uso de máscara como ação preventiva. Pesquisa Datafolha publicada nesta quarta aponta um empate técnico. 52% são contra o uso da peça em locais abertos. E 48% se declaram favoráveis. É pau a pau. O verdadeiro FLA-FLU da cultura política brasileira. Mais ou menos por aí.

Com o número de casos em queda, é natural que aumente a resistência ao uso da máscara em ambiente aberto. Ainda assim, parece alta a adesão a uma medida mais restritiva. Aqui também se pode especular sobre a fraqueza dos “argumentos” bolsonaristas – que não conseguem atrair nem apoiadores mais fiéis do presidente.

Nas ruas, nas calçadas, pelas esquinas, em diferentes bairros da cidade por onde ando, quase ninguém usa máscara ao ar livre. Deve ser assim no país inteiro. Em algumas situações, no queixo ou pendurado na orelha, o troço ganha até contornos de comédia. O problema é que são mais de 600 mil mortes no país. Nada de engraçado, portanto. 

Não costumo usar o objeto quando estou caminhando contra o vento, sem a proximidade de pessoas. No lugar fechado, sempre de máscara – menos no boteco, ao consumir... Devidamente vacinados, estamos certos agindo assim? Não sei. Pregar o bom senso adianta alguma coisa? O que é razoável, o que é excesso? No país dividido, faço perguntas.

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