Por que Bolsonaro se engajou na eleição da Câmara

19/12/2020 08:22 - Blog do Celio Gomes
Por redação
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Sempre tem confusão, mas agora a coisa parece muito mais confusa do que sempre foi. Falo da eleição para presidente da Câmara dos Deputados. Desde a redemocratização, os embates pelo comando do parlamento tiveram, claro, capítulos de tensão, jogadas inesperadas e traições em alguma escala. Na disputa de agora, naturalmente, tudo isso também vai ocorrer em alguma gradação. O que diferencia a eleição de hoje de todas as anteriores é o papel do presidente da República. Nunca houve um presidente – de Collor a Temer – tão engajado numa campanha eleitoral pela presidência da Câmara.

Sim, de Collor a Temer, todos tiveram seus candidatos e atuaram por eles. Não há ineditismo em Bolsonaro tentar emplacar seu favorito. Inédito, arrisco dizer, é a forma como o Capitão Antivacina se mete no assunto. O homem da “nova política” transformou a briga pela Câmara num mercadão em que ele promete tudo e mais alguma coisa aos parlamentares que toparem fechar com seu candidato. É praticamente compra de voto.

Compra de voto, vamos lembrar, é um negócio que não precisa ser feito necessariamente com dinheiro vivo. Um cargo, por exemplo, é uma maravilha. Destravar as verbas de uma emenda é outra forma de sedução. A assinatura de um convênio que está engavetado também pode agradar. Tem gente mesmo à espera de ministérios para declarar voto ao candidato de Bolsonaro. Por tudo isso o deputado Arthur Lira está confiante na vitória.

O alagoano ainda não tem adversário. A turma do atual presidente, Rodrigo Maia, gasta reuniões e palavrório para chegar a um nome de consenso. Mas nesta sexta-feira Maia conseguiu costurar um bloco de partidos que soma 280 deputados. As legendas ao lado de Lira somam 207 parlamentares. Isso não significa que todos de um bloco votam no mesmo candidato. Esse arranjo não define um vencedor. Devemos ter segundo turno.

Mesmo alinhados a um bloco, os partidos vão lançar vários candidatos. Para sair vitorioso de primeira, o concorrente precisa de 257 votos – o que não parece fácil pra nenhum lado. Então, os dois mais votados vão para nova disputa – e aí sim os blocos fechados agora serão decisivos. De todo modo, Maia mostrou força ao atrair PT, PCdoB, PDT, PSB e Rede para seu grupo. Até então, a galera da esquerda não havia escolhido um lado inicial.

Um parêntese. Bolsonarista meio no armário, meio envergonhado, João Henrique Caldas ficou chateado com a decisão de seu partido, o PSB, em se juntar ao bloco de Rodrigo Maia. JHC, prefeito eleito de Maceió, preferia o lado de Arthur Lira – se não por nada, para bajular Bolsonaro. O futuro prefeito é de uma legenda de “esquerda”. É moderninho também. Mas esbanja todos os cacoetes desse primitivismo que o ridículo Bolsonaro sintetiza.

Fechado o parêntese, volto a Brasília e ao Congresso Nacional. O que faz Bolsonaro enfiar suas mãos sujas na eleição da Câmara é a sombra da lei. Ele e sua família de meliantes precisam se blindar. O presidente que desonra o cargo também morre de medo de um processo de impeachment. Crime de responsabilidade – o motivo pra afastamento – tem de sobra. Há dezenas de pedidos na Câmara. Por isso ele precisa de um presidente na coleira.

A investida de Bolsonaro, reitero, não tem precedentes. Nenhum presidente da República precisou tanto e tão desesperadamente de um pau mandado na direção da Câmara dos Deputados. Arthur Lira seria isso? Não sei. Aliás, não é este seu perfil, como todos sabem. Estou dizendo o que Bolsonaro quer. Se vai conseguir ou não, veremos lá adiante. A eleição, que ocorre em primeiro de fevereiro, é crucial para o governo. E para o país.

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