“Vingadores – Ultimato”: a imprensa e a arte

05/05/2019 14:21 - Blog do Celio Gomes
Por Redação

Nos últimos dias, o assunto que mais apareceu na imprensa brasileira foi a estreia de Vingadores: Ultimato. Cada lançamento do cinemão americano por aqui recebe esse tratamento especial. Na TV, os repórteres, apresentadores e comentaristas parecem em êxtase quando falam do filme. É como se estivéssemos diante da maior obra-prima de todos os tempos, algo que todos têm obrigação de conferir. Temos uma campanha para tornar o troço um fenômeno de bilheteria sem precedentes.

Esse tipo de manipulação dos fatos expõe como a tal colonização cultural se renovou entre nós para ficar ainda mais forte nos tempos da revolução digital. Rezava uma antiga lenda que, com a internet, com o acesso de todos a todo o tipo de informação, ninguém mais ficaria refém do entretenimento imposto pela indústria da grana. Deu-se o contrário, como se vê não apenas no caso dos Vingadores. A avalanche de bobagens consumida como grande arte é um espanto. Horrorosa tradição renovada.

Não estou falando da qualidade do filme. O ponto mais chamativo nisso tudo é a cobertura da imprensa. Por isso falei em manipulação. Nos canais de TV por assinatura, tipo Globonews, Band News, GNT e coisas assim, há entrevistas e até demorados debates sobre o “filmaço” dos heróis que vieram dos quadrinhos. Nunca vi tanto “especialista” em cinema e HQ quanto agora. O que acontece, afinal, para que os brasileiros dediquem tamanha reverência a esse tipo de jogada marqueteira?

A abordagem destinada ao filme no noticiário, sobretudo na TV e na internet, é de um constrangedor deslumbramento. Profissionais do jornalismo parecem um bando de adolescentes idiotizados. De repente, senhoras e senhores sisudos se mostram como fãs histéricos diante de seus ídolos que seduzem pelos superpoderes. Agora imagine a performance de jornalistas jovenzinhos e “descolados”. Chegam a dar pinotes e fazer caretas. Pode pensar na expressão “vergonha alheia”.

Não, eu não sou um militante contra o imperialismo americano. A arte está em todo lugar, não tem fronteira nem território exclusivo. Também não separo cultura de massa e alta cultura. Sem esticar por esse caminho, o problema com a celebração embasbacada para Vingadores é como a força do dinheiro arrasa com todos os princípios que possamos pensar – morais, éticos e estéticos, digamos assim. É claro que os donos do filme pagam por essa publicidade disfarçada de notícia.

Muita gente ainda prega por aí que o povão é que não tem lá boas escolhas quando o assunto é diversão e arte. Desinformados, os ignorantes engrossam as filas para ver qualquer porcaria. Não precisava, mas Vingadores, o filme-franquia, é só mais uma prova incontestável de que essa ideia foi e sempre será preconceito. Fanáticos desse cinema padronizado e insosso estão democraticamente distribuídos da base ao topo da pirâmide. Ricaços, pobres, doutores e analfabetos na mesma onda.

Antes de fechar, preciso então explicar ao leitor o que achei de Vingadores: Ultimato, o filme do ano, da década, do século! É o seguinte: não vi, não gostei, não verei e vou gostar cada vez menos. Ao contrário do senso comum (sem querer me gabar), piruetas, correria, seres voadores e efeitos especiais sempre me transmitem um tédio infernal. Superprodução, milhões de dólares, estrelas fabricadas, água com açúcar, imprensa sócia dos estúdios... Cinema é outra coisa. É outra viagem.

Comentários

Os comentários são de inteira responsabilidade dos autores, não representando em qualquer instância a opinião do Cada Minuto ou de seus colaboradores. Para maiores informações, leia nossa política de privacidade.

Carregando..