Nosso problema são os alfabetizados
Alagoas é o estado com a maior taxa de analfabetismo do país. É o que revela o mais novo levantamento do IBGE divulgado nesta sexta-feira. Segundo a pesquisa, 18,2% não sabem ler nem escrever. A Secretaria de Educação se apressou em emitir nota para responder aos fatos. Começa com uma pérola: reconhece a dívida social no combate ao analfabetismo “durante décadas”, mas assegura que tudo mudou a partir de 2015, com “um dos principais compromissos da atual gestão”.
Ou seja, a culpa é da herança maldita. A gente não sabia, mas, desde o primeiro ano do atual governo, há uma revolução silenciosa no ensino público alagoano. Acho que é a leitura que posso fazer a partir da nota oficial. Deixando de lado o trabalho vigoroso em andamento, quero falar é da preocupante taxa de alfabetizados que nos atormenta. É aí que mora a perigosa encrenca.
Nossa tragédia está na qualidade dos que sabem ler e escrever. Outro dia, apontei aqui as barbaridades num comunicado da Ufal que era um verdadeiro atentado à língua portuguesa. Diariamente, vemos pronunciamentos de autoridades dos mais variados segmentos que parecem recorrer a algum idioma alienígena. Uma forma estranha traduz pensamentos tortos.
Vamos combinar que a imprensa está aí para provar o quanto ser alfabetizado não garante a ninguém a correção das ideias. Os exemplos são assombrosos. As redes sociais, então, nem se fale. Os casos mais engraçados são os de elementos que não sobrevivem a uma concordância, uma crase, e tentam nos convencer de que podem falar – com autoridade – sobre os rumos da filosofia!
Pense nos grandes youtubers do país. A maioria precisa ser apresentada, com urgência, ao universo da palavra. Se no princípio era o verbo, ficou encarcerado por lá mesmo, nos primórdios. Os “influenciadores digitais” vieram direto de uma dimensão ágrafa. Que eles sejam influentes, isso diz uma enormidade sobre a civilização alfabetizada. São piores que analfabetos.
Um amigo me enviou, há algumas semanas, a reação de um professor universitário a um texto que publiquei no blog. Tomei um susto, não com o chilique raivoso do rapaz, mas com sua inacreditável destreza na construção de frases. A coisa era tão bizarra, que parecia uma peça (involuntária) de humor. Mais assustado fiquei ao constatar que o autor tem até doutorado.
Vejam bem: professor e doutor, que forma jovens numa universidade, e que não consegue botar uma vírgula no lugar adequado. Sem falar na indigência dos argumentos, uma mistura de rabugice e bobagens a rodo em defesa de uma suposta “alagoanidade”. Esse é o nível intelectual em nossa academia? Como uma toupeira pode ensinar qualquer coisa em qualquer faculdade?
E não se pode esquecer a exuberância de erudição que é a marca de nossos políticos. O padrão degenerado não é privilégio de nenhuma esfera específica. Mas, como ilustração, vejam entrevistas e discursos na Câmara Municipal de Maceió e na Assembleia Legislativa. É desalentador. Por isso, defendo uma campanha de combate ao analfabetismo entre doutores alfabetizados.
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