O candidato que a imprensa inventou
A candidatura que nunca existiu é uma dessas notícias que servem para analisar o trabalho da imprensa. Claro que me refiro à decisão do prefeito de Maceió, Rui Palmeira, que anunciou não ser candidato ao governo do estado. O anúncio em tom singelo, por meio de um vídeo com baixa qualidade, contrasta com a gravidade da mensagem. Pensando bem, é até desconcertante.
E também é assim porque, há vários meses, notícias de todos os tamanhos, em todos os suportes, não deixavam dúvida quanto ao candidato Rui Palmeira. Uma vez cogitada, ninguém mais sequer mencionava a sério a hipótese de o prefeito não topar a aventura. O mesmo vale para textos de opinião – que assim como as reportagens tratavam Rui como um candidato em plena campanha.
Dizendo com outras palavras, se não estiver enganado, todos nós jornalistas informamos – com mais ou menos ênfase – que a candidatura de Rui Palmeira era inevitável. Por que dissemos isso, e com tanta convicção, passando ao leitor a ideia de que apuramos os fatos com rigor? O anúncio de Rui agora desmente essa suposta metodologia de trabalho. Estávamos todos chutando?
(Corta para 2014. Sem partido, qual o destino de Marina Silva nas eleições presidenciais? Foi um carnaval de “revelações” e “bombas”, todo santo dia, sob a assinatura dos maiores colunistas políticos do país. Quando Marina anunciou que seria vice na chapa com Eduardo Campos, descobriu-se que todas as certezas e previsões não passavam de embromação com grife).
Blefe e especulação têm lugar de destaque no noticiário sobre a seara política. De repente, o que era apenas uma distorção deliberada, sem a devida checagem por ninguém, acaba virando verdade aceita sem contestação. A negligência com a apuração combina com a superficialidade da informação levada ao público. No automático, passamos adiante ficção como realidade.
Como um de nossos esportes é desconfiar de tudo, quem acredita que os erros, equívocos e exageros da imprensa são frutos da natureza? Provavelmente você tem certeza de que erramos por algum interesse, certo? E de fato não é fácil contestar quem assim desconfia do chamado jornalismo profissional. A responsabilidade é toda nossa. O caso Rui Palmeira tem seu lado pedagógico.
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