Debate sobre liberação de armas: a demagogia na ponta do fuzil

28/02/2018 02:04 - Blog do Celio Gomes
Por Redação

Se a intervenção federal no Rio resultará em coisa boa para a população, há controvérsias. Mas a medida produziu um efeito colateral instantâneo, ainda que involuntariamente: insuflou o debate sobre o direito à posse de arma de fogo pelo cidadão comum. Em todos os segmentos e camadas sociais, parece haver gente que só pensa nisso – quer um 38 ou uma pistola para se proteger da bandidagem. Os defensores da ideia querem revogar o Estatuto do Desarmamento.   

 

Confesso que o tema não me empolga muito. Não entendo bem por que tamanha passionalidade entre os que reivindicam a legalização de portar uma arma. Ao ver os argumentos dos adeptos do armamentismo geral, é difícil encontrar algo de fato convincente. Os discursos nessa linha abusam de comparações com os Estados Unidos, forçando a mão para aplicar raciocínios atravessados, como se atestassem a justeza em se adotar a liberação de armas. Parece apenas um truque retórico.

    

Sendo um legítimo bate-boca dos dias atuais, se não tiver gritaria, achincalhe e palavrões, não tem graça. Por isso, enquanto não podem sacar uma ponto-40 contra os inimigos, os senhores do clube do tiro disparam uma fuzilaria verborrágica (e ofensiva) sobre adversários de suas ideias. Não digo que são todos, mas uma boa parte se manifesta como inteiramente desmiolada. Imagine esse tipo de indivíduo com poder de fogo. Afinal, por que você e eu precisaríamos andar armados?

 

Se há gritaria e ofensas nas discussões sobre o assunto em redes sociais, naturalmente a discórdia começa e nunca termina nas diferenças políticas inconciliáveis. Dizendo de outro modo, mas não muito, aqui também, como tudo nessa vida, nunca haverá acordo entre tais escolhas ideológicas. Antes de ouvir os argumentos, os lados querem saber se estão falando para a direita ou para a esquerda. Rodamos em volta de todo e qualquer assunto, e ficamos no eterno e estéril maniqueísmo.

 

Um bocado de autoridade em Alagoas anda por aí mostrando simpatia à ideia que prevê todo mundo armado. A conversa demagógica é a mesma desde sempre: vamos desarmar o marginal e armar o cidadão de bem. Eis um discurso velho, tipicamente populista, que joga tudo no clima de pânico social para vender uma falsa solução. A fixação nessa pauta é uma das frentes na campanha de Jair Bolsonaro. Não por acaso a coisa esquentou nos últimos meses na turba fiel ao homem. 

 

Para fechar, lembro ainda que há um aspecto curioso no palavrório dos armamentistas: também para este insano debate, a tropa de choque da bala convocou nada menos que Deus e as escrituras sagradas. Sim, para os ideólogos do Velho Oeste, a bíblia cristã está recheada de cantos, cartas e provérbios que justificam o uso da força contra seus inimigos. Ora, se está escrito, quem somos nós, pecadores compulsivos, para discordar? Então, pode apontar e engatilhar seu fuzil – e seja feliz.

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