Campanha da Globo vira piada e expõe monopólio da informação

30/01/2018 13:26 - Blog do Celio Gomes
Por Redação

E aí, já gravou seu vídeo e enviou para a Rede Globo dizendo que Brasil você quer para o futuro? Não esqueça de gravar com o celular deitado, na horizontal, ok? Eu não sei o que é mais tedioso na campanha da emissora – se a repetição incessante da mensagem ou o didatismo de apresentadores e repórteres, que parecem se dirigir a um público de desmiolados. A iniciativa da Globo está sendo bombardeada nas redes sociais e em sites de notícias de grande audiência.

 

A essa altura, a coisa já é alvo de todo tipo de crítica e também – o que é muito melhor – de um festival de piadas. Segundo li, é imensa a quantidade de vídeos enviados à TV nos quais a própria Globo é esculhambada de todas as maneiras. A mensagem mais recorrente, com poucas variações na fala dos telespectadores, diz mais ou menos o seguinte: “Quero um Brasil no futuro sem as notícias mentirosas da Globo”. E olhe que essa é a versão mais leve no teor das gravações.

 

Santa inocência: a emissora parece que não contava com essa espécie de inversão de fatores, o que é, por razões óbvias, quase inexplicável. Boa parte do público atende à convocação, mas não do jeito obediente e passivo, que era o esperado pelos mentores da ideia. Muitos dos vídeos que disparam contra a Globo – e que não serão exibidos, é claro – estão no Youtube. O conteúdo oscila entre a revolta mais barulhenta e ótimas sacadas de ironia. Recomendo para quem ainda não viu.

 

A reação furiosa pelo país inteiro causou profundo incômodo na cúpula da televisão da família Marinho. Consta que a direção se arrepende de ter lançado a campanha, mas agora não há mais o que fazer. O jeito é fingir que está tudo lindo e usar os vídeos que se encaixam na proposta original. Mas pelo menos em um ponto a emissora recuou. O pedido para você gravar em local turístico mudou; pode mostrar problemas também – como as pessoas já fazem, sem pedir permissão.

 

Há um aspecto nisso tudo sobre o qual ainda não se falou até agora. E eu considero o dado mais grave. Mais uma vez, a Globo inventa suas marmotas e empurra goela abaixo de suas afiliadas. A Globo não é proprietária da TV Gazeta de Alagoas ou da TV Sergipe. Também não é dona da TV Verdes Mares ou da TV Bahia. Mas na prática a relação entre rede e afiliadas é exatamente a de proprietário e subordinados. A ordem chega de cima e, sem piscar, todos obedecem.

 

Veja se isso não é um monstrengo. Esse mesmo texto idiota, que manda você “gravar com o telefone deitado”, é dito por um César Tralli, em São Paulo, e repetido por um Amorim Neto, em Maceió, e centenas de jornalistas, em todas as afiliadas, do Paraná ao Acre, atravessando sertões e pantanal. Ou seja, o monopólio dos meios de comunicação – que é proibido por lei – é escancarado no controle de conteúdo exercido pela Globo. É assim há cinco décadas.

 

Ao tramar uma idiotice como esta campanha, a Globo simplesmente determina o que fazer aos diretores das afiliadas. Se algum desses diretores regionais ao menos questionar a ideia, já era: ou será enquadrado rapidamente ou perde o cargo. Eu vi isso de perto durante dez anos de trabalho no departamento de jornalismo da TV Gazeta. Sei do que estou falando. A autonomia do jornalismo das TVs ligadas à Globo é zero. Liberdade mesmo só existe para produzir baboseiras.

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