A 'Número 1': a história de uma pioneira que escolheu Arapiraca para ser sua terra

19/06/2016 09:46 - Clau Soares
Por redação
Image

16h03. Pelo Whatsapp, informo que estou no local marcado. Às 16h04, minha entrevistada responde: “bata no portão ao lado”. Todos os contatos realizados, nas últimas semanas, para combinar a entrevista que resultou nesse texto foram feitos pelo aplicativo. Absolutamente normal, exceto pelo fato de a minha interlocutora ter nascido em 1936. Aos 79 anos, residindo em Arapiraca, ela tem uma história surpreendente e incomum. Ela é Almira Gouveia Alves Fernandes, uma pioneira.

Em uma época na qual a maioria das mulheres tinha no casamento a única opção, ela preferiu investir em uma carreira profissional. Aos 14 anos, já lecionava em uma escola no bairro Bebedouro. Aos 18, morou no Rio Grande do Sul, durante um ano, onde fez o curso de Orientação Educacional do Ministério da Educação e Direção de Ensino Primário. De volta a Alagoas, iniciou o curso de Serviço Social. E tudo isso com o apoio da família.

Prestes a fazer 80 anos, Almira relembra os primeiros passos de uma carreira que se tornaria referência de pioneirismo em Alagoas com uma clareza e vivacidade que emocionam. De Maceió, mas radicada em Arapiraca, desde meados da década de 1960, ela tem o registro no 001 de assistente social no Conselho Regional de Serviço Social de Alagoas e foi primeira a ser nomeada para ocupar a função na estrutura do Executivo estadual.

A turma pioneira da Escola de Serviço Social Padre Anchieta de Alagoas colou grau, em 1961, em Maceió. Somente 13 mulheres concluíram o curso em uma profissão praticamente desconhecida em Alagoas e ainda recente em todo o mundo. Entre elas, dona Almira que, da cadeira universitária, seguiu direto para atuar na área, como servidora pública. “Das 13, quatro já partiram e uma reside fora de Alagoas”, afirma. Ainda em contato, as demais precursoras se reúnem mensalmente. “Continuamos unidas”.

Seu trabalho de conclusão de curso “O Serviço Social Rural visando à Organização Comunitária de Chinaré” foi traduzido para o inglês para subsidiar os estudos de sociologia rural nos Estados Unidos. Almira foi duas vezes aos EUA. Em 1964, para um curso no Peace Corps Training Center, na Universidade de Wisconsin e para representar AL no Congresso do Movimento dos Companheiros da América – Brasil x EUA.

Seu maior desafio, porém, surgiu pouco depois de graduada. A pedido do governador da época, Major Luiz Cavalcante, ela veio para Arapiraca para descobrir as necessidades do interior do Estado e contribuir para ampliar a atuação governamental nas áreas de saúde e assistência social.

O funcionamento de um hospital foi apontado pela sociedade local como o maior problema da região. Segundo Almira Fernandes, na capital do Agreste, existia apenas a estrutura física de uma sociedade filantrópica que se tornou o Hospital Regional, de cujo processo ela participou diretamente. “O Estado concluiu o hospital e nós inauguramos”, lembra.

Em meio à procura por parceiros para colocar o hospital em funcionamento, ocorreu um fato que mudaria a trajetória da jovem Almira: ela conheceu o médico do posto de saúde, Judá Fernandes. “Isso foi por volta de 1963”, pontua.

O resultado deste encontro muitos arapiraquenses conhecem. Uma história de amor digna de contos de fadas que, em 2016, fez 50 anos, com seis filhos e onze netos. “50 anos de feliz casamento. É por isso que não reclamo de ter deixado tanta coisa na minha vida profissional porque Deus me recompensou muito na minha vida matrimonial”, confessa.

Com o matrimônio, a carreira de assistente social teve o ritmo reduzido, mas não abandonada. Além de se envolver em diversos projetos sociais, religiosos e filantrópicos, dona Almira e o esposo Judá participaram de grandes empreendimentos em Arapiraca, como na fundação do Lions Clube e chegada da rádio Novo Nordeste. “Considero Arapiraca como minha terra”, afirmou d. Almira, que atuou ainda como assistente social no Hospital Regional e lecionou em escolas públicas na cidade.

Apesar de, atualmente, ficar mais em casa, ela continua a receber homenagens (é cidadã honorária de Arapiraca) e convites para palestras. Almira é ainda autora/organizadora de cinco livros, entre os quais está a obra “Pioneiras do Serviço Social em Alagoas: Turma 1960”, que celebra os 50 anos de graduação da primeira turma de assistentes sociais do Estado.  

Mesmo com as restrições impostas pela idade, Almira Fernandes tem nos gestos e na fala a força de uma mulher que tem consciência de que o limite, nesta vida, é ser feliz. 

Your alt text
Your alt text
Your alt text
Your alt text
Your alt text
Your alt text
Your alt text
Your alt text

Comentários

Os comentários são de inteira responsabilidade dos autores, não representando em qualquer instância a opinião do Cada Minuto ou de seus colaboradores. Para maiores informações, leia nossa política de privacidade.

Carregando..