A cúpula da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que apura a violência contra jovens negros no Brasil tem resistido em aprovar requerimentos que chamem ministros petistas ou governadores do partido e aliados para prestarem esclarecimentos sobre a condução das políticas de segurança implantadas.
A reclamação sobre as tentativas de blindar as autoridades é feita nos bastidores por membros da comissão. Na última reunião, o requerimento apresentado pelo deputado Luiz Couto (PT-PB) pedindo a oitiva do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, estava na pauta, no entanto não foi colocado em votação pelo presidente da comissão, deputado Reginaldo Lopes (PT-MG). Para não votar o pedido, Reginaldo alegou que o autor não estava presente no plenário.
O presidente nega blindagem. Apesar do requerimento não ter sido apreciado, segundo ele, a CPI deverá convidar o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, para prestar esclarecimentos sobre a política nacional de segurança.
“Primeiro queremos ouvir, saber quais são as ações que o Ministério está pensando. Queremos socializar com ele a ideia de fazer a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) para ampliar a concepção sobre segurança pública de maneira compartilhada. Queremos que ele responda sobre a questão da segurança nacional, sobre o que ele acha que é ordem pública. São temas que não estão muito bem resolvidos no nosso arcabouço jurídico.”, disse o presidente da CPI, deputado Reginaldo Lopes (PT-MG).
Embora a questão de segurança pública seja de competência constitucional dos estados, durante a campanha, uma das propostas apresentadas pela presidente Dilma Rousseff foi mudar a Constituição no sentido de compartilhar entre a União, estados e municípios responsabilidades nesta área.
De acordo com relatos de integrantes da comissão, há uma resistência por parte da cúpula da CPI de cobrar das autoridades da esfera nacional e dos estados, principalmente governadores petistas ou membros de partidos aliados para darem explicações sobre as chacinas e mortes realizadas pela polícia.
Questão cultural
A relatora da CPI, deputada Rosângela Gomes (PRB-RJ), ao falar sobre a responsabilidade do Estado em relação à violência contra negros patrocinada pela polícia também contemporizou e apontou questões culturais na origem do problema.
“Quando se fala do Estado, eu teria cuidado neste posicionamento. Eu acho que isso já vem de muitas décadas, é um problema de desigualdade acentuada. É um problema cultural. Este problema acentuado ele perpassa pelo Estado, enquanto estado mesmo. Não é só Estado enquanto estado polícia”, disse a deputada. “Eu não posso dizer para você que o problema é só a polícia mata. A meu ver, não é por aí”, destacou.
A deputada ainda apontou questões familiares como geradoras do problema. “Eu penso um pouco mais de forma ampliada. Por exemplo, quando nós deixamos de fazer um planejamento familiar , quando deixamos de dar educação”, explicou.
“O estado tem obrigação de manter a ordem social em todos os sentidos. É um direito que a constituição nos dá”, alegou a relatora. “Existe uma inércia de tudo que no final se tem o conflito. Este conflito acaba sempre com acorda arrebentando pelo lado mais fraco. Por outro lado, a polícia tem o papel que os seus comandantes lhe obrigam a fazer, que é de prender, reprimir”, ponderou.
Contradição
Na última reunião da CPI, em meio a depoimentos de parentes de vítimas da chacina do Cabula, bairro da periferia de Salvador onde foram mortas 12 pessoas por ação da polícia baiana, deputados mais conservadores também apontaram a “desagregação da família” como um dos motivos da violência contra negros, o que irritou os parentes das pessoas executadas de forma sumária pela polícia.
Já a deputada Benedita da Silva (PT-RJ) contestou as tentativas de isentar as autoridades da responsabilidade sobre os crimes e reagiu às tentativas de culpar as famílias pela violência.
“É engraçado que aceita se falar sobre a responsabilidade do Estado que se diz o Estado que não deu Educação, que não deu Saúde. Mas quando se fala da polícia, aí não é o Estado?”, questionou Benedita. “É uma contradição. É o Estado sim, nós sabemos e não importa quem é que esteja governando”, reagiu.
Por Luciana Lima - iG Brasília