A Importância do Turismo na Economia Alagoana

21/03/2014 06:00 - Fábio Guedes
Por Fábio Guedes Gomes
Image

Alagoas é um lugar de grandes contrastes. Academicamente falamos em contradições. Um espaço geográfico na região mais semiárida do planeta. Felizmente, apenas 45,2% de seu território apresenta esse tipo de condição hostil à culturas e sobrevivência humana. Uma dádiva se comparamos isso com o tamanho da área semiárida do Rio Grande do Norte [92,9%], Pernambuco [87,6%], Ceará [86,7%] e Paraíba [86,2%].

Por outro lado, o encontro de suas lagoas e rios com o mar lhe confere uma sinuosa beleza com potenciais econômicos fantásticos para a atividade turística. Está mais que comprovado que no sentido oeste do estado também podemos encontrar outros sítios maravilhosos para se visitar e conhecer. Mas, infelizmente, os interesses, sobretudo empresarial e a falta de políticas públicas, devotam maior atenção ali onde, de fato, os equipamentos turísticos e serviços contam com melhores sistemas de infraestruturas e abastecimento.

Recentemente, alguns amigos e colegas têm debatido qual o significado do turismo para Alagoas. Sabe-se que essa atividade econômica é bastante complexa e o grau de informalidade muito contribui para nos afastarmos do conhecimento de sua realidade com mais precisão. Além disso, o dados disponíveis são parcos no estado e carecemos de estudos mais aprofundados sobre a cadeia e impactos das atividades voltadas aos serviços turísticos na economia local.

Enfatizo “serviços turísticos” porque, muitas vezes, essa cadeia é, equivocadamente, categorizada como “indústria do turismo”. Ora, se fosse indústria estaria classificada como tal nos relatórios e cadastros do IBGE, por exemplo, e noutras instituições de pesquisas. Trata-se de serviços mesmo. Hotéis, restaurantes, trades, agências, receptivos etc. prestam serviços. Certamente, quanto mais eles se ampliam movimentam outras cadeias de fornecedores e produtores.

Um restaurante, por exemplo, apesar de produzir refeições e pratos, o que podemos considerar atos de produção, muitas vezes em escala industrial, entretanto não depende exclusivamente daquilo que está disposto no cardápio; outros importantes aspectos estão envolvidos, como atendimento, recepção, conforto, limpeza e higiene etc. Numa indústria a atividade central é produzir bens materiais, em hotéis e restaurantes, por exemplo, a atividade central é servir, mesmo que para isso se produza algo no interior dessas atividades.

O setor de turismo medido pelo crescimento do Valor Adicionado à Produção [VAP] das atividades envolvidas diretamente, como hotéis, agências de turismo etc. e o segmento de alimentação, vem crescendo na composição do PIB estadual. Infelizmente, esse dado é o mais usual quando procuramos aferir a contribuição do turismo em determinada economia, além da geração de empregos nesses setores. Conforme podemos observar no gráfico abaixo, a participação do setor de turismo e alimentação no PIB alagoano [menos os impostos], cresceu de 1,61%, em 2002, para 2,56%, em 2010 [último dado consolidado].

Percebe-se que, a partir de 2006, ultrapassamos a casa dos 2%, chegando no ano de 2010 contribuindo com mais de meio bilhão de reais à riqueza bruta de Alagoas. Para se ter uma noção, em Pernambuco essa participação era de 2,1%, em 2007, e no Ceará 2,2%, em 2009. A Bahia continua sendo o estado do Nordeste com maior contribuição desses segmentos ligados ao turismo na composição de seu respectivo PIB [4,2%, em 2011].

Esse resultado para Alagoas pode estar associado a alguns fatores além das belezas do estado, como: 1] crescimento da renda e emprego no país durante o período, permitindo com que mais pessoas procurem destinos nacionais e estrangeiros; 2] a expansão da rede hoteleira pelo Nordeste e, em especial, à Alagoas em razão de seu potencial econômico e vantagens competitivas naturais, estabelecendo novos e modernos equipamentos; 3] a ação integrada de políticas públicas e promoção dos destinos turísticos no âmbito das secretarias de turismo do governo do estado e do município de Maceió; e, 4] crescimento dos investimentos e do empreendedorismo empresarial no segmento de bares e restaurantes, principalmente na capital do estado e principais locais de atração turística.

Em termos absolutos, o VAP evolui no setor de hotelaria e alimentação em Alagoas de apenas 158 milhões de reais, em 2002, para 562 milhões, em 2010, ou seja, um crescimento de 256% no período. Como mencionado, a curva de crescimento se acentua a partir dos anos 2005-2006, como se observa no gráfico abaixo. 

A dinâmica mais intensa do fluxo de turistas tem aquecido não somente a atividade hoteleira e suas interconexões econômicas, mas contribuído, principalmente, para aquecer o mercado, faturamento e expectativas do segmento de food service, conhecido mais apropriadamente de alimentação fora do lar.

Em Alagoas, de acordo com a Pesquisa de Orçamento Familiar [POF 2008/09], do IBGE, 60% desse segmento é representado pelos restaurantes, 13% pelas casas de lanches, 9% pelas cervejarias e bares, 7% por pontos formais de comercialização de sanduíches, salgados e doces, 5% por pontos de vendas de bebidas alcóolicas e não-alcóolicas e 6% diversos.

De acordo com o Anuário Brasileiro de Alimentação Fora do Lar [2012], do Instituto Food Service Brasil [IFB], Alagoas conta com 1.738 restaurantes, o que significa uma unidade para cada 1.900 habitantes. Por exemplo, os piauienses são mal servidos de restaurantes nesse sentido, pois a relação deles é de 1 unidade/2.557. Estamos um pouco acima da relação para o Nordeste que é de 1 unidade/1.485.

Apesar de contarmos com uma quantidade razoável de restaurantes, certamente esse número concentra-se na sua maioria na capital, podendo influenciar ainda mais na diminuição da relação unidades/habitantes. Ainda, se levarmos em conta que boa parte da população do estado e sua capital não possui condições econômicas para frequentar esses ambientes ou manter uma rotina de realizar refeições fora do lar, percebemos o quanto a atividade turística é importante em Alagoas para manter esse segmento dinâmico e gerando empregos. Vejamos outros dados importantes que dizem respeito a essa realidade.

No Brasil, entre 2004 e 2014 [previsão], o número de transações com alimentação fora do lar saltou de 56,4 milhões para 70 milhões, um crescimento de 24% no período. O gasto médio per capita com refeições fora de casa subiu de R$ 6,5, em 2008, para R$ 10,78, em 2014, portanto 65% de aumento. De acordo com a POF [2008/09], a despesa média mensal familiar com alimentação fora do lar, para o Brasil, atingiu R$ 131,31. O Sudeste lidera o ranking com gasto médio mensal por família de R$ 172,78 seguido da região Sul, R$ 125,35, Centro-Oeste, R$109,84, Norte, R$ 92,68, e Nordeste, R$ 81,23. 

Não foi por acaso que o faturamento do setor de alimentação franqueada no pais saltou 217% entre 2001 e 2012, saindo de R$ 3,3 bilhões para R$ 20,5 bilhões no período, de acordo com a Associação de Brasileira de Franchising [ABF]

No ranking brasileiro, as famílias paulistanas são as que mais gastam, em média, por mês com alimentação fora do lar, R$ 198,53, seguida das cariocas, R$ 196,45, e brasilienses, R$ 182,12 [conferir gráfico abaixo]. Na média, as famílias alagoanas gastam apenas R$ 36,28 mensais com alimentação fora do lar, apenas 67% da média maranhense, por exemplo. Isso é uma demonstração cabal de nossa precária situação econômica, com a falta de geração de empregos melhores remunerados, alta concentração de riqueza e baixo dinamismo econômico.

Outro dado que reforça a precariedade da demanda por alimentação fora do lar por parte das famílias alagoanas, é quando avaliamos quanto do gasto total mensal com alimentos é despendido, em média, pelas famílias para fazer refeições em restaurantes. Observa-se no gráfico abaixo que apenas 15,9% do total de gastos em alimentação é despendido pelas famílias no estado com refeições fora do lar. Isso significa que a grande maioria das famílias alagoanas pouco, ou quase nunca, têm o prazer e o desfrute de frequentar restaurantes e/ou atender uma necessidade de alimentação nesses ambientes com certa regularidade.

 

Somente para efeito de comparação, e ainda explorando as bases estatísticas da Pesquisa de Orçamento Familiar [POF 2008/09], do IBGE, montamos o gráfico abaixo comparando a realidade dos gastos médios mensais, em reais, das famílias alagoanas e sergipanas em restaurantes. Os dados apontam uma discrepância muito elevada no padrão de consumo entre as famílias sergipanas e alagoanas em todas as faixas de renda.

Naquelas famílias alagoanas que auferem renda mensal de até R$ 830,00, as despesas com alimentação fora do lar é, em média, de R$ 11,87, apenas 22% do que gastam em média as famílias sergipanas no mesmo estrato de renda. A discrepância é muito elevada em todos as faixas de renda média familiar. Por exemplo, naquela família com renda acima de R$ 10.000,00, a despesa em média por mês da família alagoana com restaurantes alcança, apenas, 44% das despesas das famílias sergipanas. Quando comparamos essa mesma relação com o Nordeste, as despesas médias com restaurantes das famílias alagoanas acima daquela renda é de 47% da média do Nordeste [R$ 242/R$516].

Concluindo, a economia do turismo em nosso estado vem crescendo e contribuindo para que o setor de serviços, junto com as atividades comerciais e da construção civil, continue gerando empregos e atraindo riquezas para o estado. É plausível afirmar que a dinâmica dos segmentos de turismo e alimentação tem evoluído e o número de restaurantes aumentado.

Entretanto, os dados deixam muito claro que a cadeia de restaurantes e fornecedores tem se aproveitado, largamente, do aumento dos fluxos de turistas e da realização de importantes eventos no estado, os quais atraem visitantes de outros lugares. Enquanto esse fluxo continuar crescendo, restaurantes, bares e similares terão elevado desempenho, principalmente em lugares privilegiados da capital e locais mais visitados no estado. Infelizmente, o elevado nível de pobreza em Alagoas, associada a insuficiente capacidade de gerar renda e riqueza, impede que as famílias, no geral, desfrutem de alguns principais serviços promovidos pelo capitalismo moderno, como no caso analisado.

A história comprova que numa sociedade em que seu padrão de vida econômica se eleva de maneira mais equânime, esses modernos serviços crescem numa velocidade fantástica, com setores de entretenimento, lazer, cultura e gastronomia passando a figurar, definitivamente, no sistema econômico e gerando empregos e criando renda.

Em Alagoas e, especialmente, na capital, o setor de gastronomia evoluiu muito nos últimos anos, ganhou em qualidade e consegue competir com outros centros de excelência do Nordeste e até mesmo de outras regiões. Explorando sabores locais e a culinária também regional e tradicional, uma parcela dos restaurantes de Maceió, por exemplo, expandiu suas atividades em razão dos nichos alcançados, pela frequência das famílias de rendas médias e altas e, principalmente, pelo fluxo de pessoas que visitam o estado. Outros surgiram condenados ao sucesso dentro dessa dinâmica. A economia do turismo, certamente, tem feito a diferença e sem ela, com elevada possibilidade de comprovação, a gastronomia em Alagoas e o segmento de alimentação, por exemplo, estariam enfrentando dificuldades de crescimento em razão do estreito mercado consumidor local.

Portanto, o setor de food service em Alagoas tem um amplo campo ainda de expansão e precisa diminuir sua elevada dependência dos fluxos de rendas determinados pelo trânsito de turistas. É de suma importância para isso que a economia do estado volte a crescer mais intensamente, a geração de renda se amplie com a expansão de novos empreendimentos que, verdadeiramente, criem muitos empregos e produzam riqueza em nosso no estado.

Comentários

Os comentários são de inteira responsabilidade dos autores, não representando em qualquer instância a opinião do Cada Minuto ou de seus colaboradores. Para maiores informações, leia nossa política de privacidade.

Carregando..